Coronel PM RR José Roberto Dus Formado em engenharia eletrônica pela FESP Pós-graduado em antenas e microondas pela USP
Meados da década de 80 o Centro de Suprimento e Manutenção de Materiais de Telecomunicações (CSM/MTel), área de comunicações da Polícia Militar de São Paulo, ainda sentia os reflexos das restrições de importações e tinha que implantar e manter equipamentos e sistemas de rádio adquiridos no comércio local.
De certa forma isso era bom porque estimulava a empresa nacional, mas ficávamos para trás em relação ao mundo. Por causa disso, o primeiro rádio instalado no helicóptero Águia Uno do Grupamento de Radiopatrulha Aérea foi um velho Patrulheiro III da Motorola.
Pesado, com sua alta potência interferia nos instrumentos de voo e colocava em risco a missão. Esse rádio PIII tinha apenas 4 canais e ainda usava cristais osciladores em cada um deles. Como ele tradicionalmente era utilizado nas viaturas, viu-se que na prática não poderia ser empregado no helicóptero e por isso optou-se pelo rádio marca Siteltra modelo RTV-280S de 08 canais, para o projeto.
O CSM/MTel havia acabado de adquirir os primeiros rádios sintetizados Siteltra, cuja programação deles era feita numa matriz de diodos na placa do sintetizador.
Tivemos então uma ideia!
Retiramos aquela matriz e colocamos no seu lugar um conjunto de 6 chaves rotativas thumbweel. Foram montadas numa caixinha de alumínio na frente do radio. Três comandariam os canais de recepção e outras três os de transmissão. Com isso o rádio cobriria toda a faixa de VHF onde estavam as frequências da Polícia Militar, Polícia Civil, Copo de Bombeiros e policiamento de trânsito.
Estava feito o primeiro rádio de 1000 canais para uso no Águia! Mostramos o protótipo ao fabricante que gostou da ideia e produziu alguns com acabamento mais profissional.
Reduzimos a potência para 5W para não prejudicar os instrumentos de voo e instalamos a antena na parte inferior da aeronave. Os novos equipamentos foram homologados. As fotos abaixo mostram em parte o que fizemos.
O piloto levava uma tabelinha consigo, onde para cada rede aparecia um numero de 9 dígitos que devia ser programado no painel. O equipamento cobria de 154 a 172 MHz, capaz de manter contato com todas as redes da segurança que operavam naquele limite.
Hoje já existem rádios modernos que fazem tudo isso, mas naquela época realmente foi um grande desafio e ficamos muito orgulhosos em poder ajudar o GRPAe. Apesar da rusticidade, foi uma das melhores ferramentas de comunicação que a PM já teve. Ele era operado com grande eficiência e confiabilidade.
Apesar de alguns técnicos do fabricante acharem que esse resultado seria impossível de se obter com o equipamento, a persistência e confiança no projeto mostrou que era viável e seguramente a qualidade do rádio impulsionou os bons resultados que levaram à expansão da Aviação Policial Paulista.
Como, a partir do zero, iniciou-se um policiamento inédito no Brasil. Conheça o valor histórico de formação do Grupamento de Radiopatrulha Aérea da Polícia Militar do Estado de São Paulo.
No ano em que comemoramos o Jubileu de Prata do Grupamento de Radiopatrulha Aérea da Polícia Militar é importante fazer um passeio ao passado, não muito distante, para conhecermos as condições que propiciaram a implementação daquele então novo meio de policiamento, as adversidades encontradas, e outras nuances que não podem e não devem ser nunca esquecidas.
Em 1983, depois de um longo período em que os governadores dos Estados eram indicados e nomeados pelo Governo Federal, tivemos a primeira eleição para este cargo, tendo vencido e assumido o cargo o Governador André Franco Montoro.
Junto com a eleição seguiram-se uma série de manifestações que, sob a bandeira da então “conquistada liberdade”, promoviam uma baderna generalizada, com ênfase às depredações e saques, principalmente de supermercados e outros tipos de comércio.
O pânico tomava conta da população e a polícia, apesar de todo o seu empenho, não conseguia acompanhar o ritmo das manifestações que “pipocavam” em todos os pontos da nossa maior metrópole.
As autoridades decidiram por bem alocar helicópteros utilizados pela CESP – Centrais Elétricas de São Paulo – no trabalho de inspeção de linhas, à Polícia Militar, a fim de serem utilizados como plataformas privilegiadas de observação e acompanhamento de movimentação anormal e suspeita da população, para otimizar o emprego das tropas em terra e, assim, conseguir restabelecer a ordem pública.
A iniciativa foi tão bem sucedida que a ela se seguiu a locação de helicóptero para continuar aquela atividade e ajudar no policiamento. Até então, tais helicópteros eram pilotados por civis e tinham em sua tripulação, como observadores, policiais militares do Comando de Policiamento de choque. Missões bem sucedidas ensejaram que o Governo do Estado adquirisse dois helicópteros, sendo um para a Polícia Militar, que ganhou o designativo operacional de “Águia Uno” (designativo que se mantém até hoje) e outro para a Polícia Civil, com designativo operacional de “Pelicano”.
A data de entrega de tais aeronaves, já caracterizadas com as cores e logomarcas de suas instituições, foi em 15 de agosto de 1984, no heliponto do Palácio dos Bandeirantes.
Antes mesmo da entrega, a Polícia Militar já se antecipara na preparação de pessoal e na estruturação, ainda experimental, da nova Unidade que, por ter abrangência estadual, subordinava-se diretamente ao Subcomandante da Polícia Militar.
Pessoal e formação
Para a função de pilotos, inscreveram-se mais de 600 Oficiais. Como não haveria tempo hábil para submeter todos aos longos e exaustivos exames, optou-se por uma pré-seleção, em que cerca de 40 Oficiais foram submetidos a exames tanto no âmbito da Polícia Militar como pelo pessoal do Centro de Seleção da Força Aérea.
Os Oficiais selecionados iniciaram o Curso Teórico de Piloto de Helicópteros na Escola Superior de Aviação, no Campo de Marte, com cerca de 45 dias de atraso em relação aos demais alunos. No decorrer desse curso, surgiu a oportunidade de três Oficiais fazerem o Curso de Piloto de Helicópteros na Marinha do Brasil, na Base Aeronaval de São Pedro D’Aldeia. Alguns Oficiais, já concursados anteriormente, e mais outros participantes deste novo concurso, sendo que três deles acabaram fazendo o curso na Marinha.
Desta forma, o grupo inicial de pilotos, ficou constituído de sete Oficiais, sendo três formados na Marinha e quatro formados em escola particular, passando posteriormente por um curso de padronização na Força Aérea Brasileira, na Base Aérea de Santos.
Assim sendo, o primeiro grupo de pilotos de helicópteros da Polícia Militar ficou composto pelos seguintes Oficiais, com suas respectivas patentes à época : Ten Cel PM Ubirajara Guimarães (primeiro Comandante da Unidade); Capitães PM Gérson Vitória, Sérgio Luchesi, Marco Antônio Visconti e Waldir dos Santos; 1º Ten PM Irineu Mota Filho e Otacílio Soares de Lima.
Para as demais funções, aos poucos foram sendo selecionados Praças que apresentavam perfil aparentemente adequado para ser Tripulante Operacional. E por que aparentemente ? Simplesmente porque não se sabia até então qual era esse perfil, daí o bom número de Tripulantes Operacionais serem oriundos do COE (Comando de Operações Especiais), que era a tropa da Polícia Militar com mais familiarização com voos em aeronaves de asas rotativas.
Até que os Oficiais estivessem prontos para o desempenho pleno de suas funções, os helicópteros eram pilotados por civis, tendo como segundos pilotos os Oficiais já selecionados e em curso prático de pilotagem.
Diversidades iniciais
Inúmeras foram as adversidades encontradas no início deste desafio de se implantar e mostrar, em pouco tempo, eficiência numa nova modalidade de policiamento. Destacaremos algumas delas :
→ Afora algum resquício existente, não havia no Brasil, em qualquer Estado, uma unidade independente sequer de policiamento com emprego de helicópteros que pudesse nos fornecer algum parâmetro para implantação, carecendo a autorização de todas as decolagens de governadores de Estado, o que inviabilizava o emprego do helicóptero, com uma de suas maiores vantagens, qual seja, a rapidez;
→ Incompreensão inicial de diversos setores da sociedade, como a imprensa e as associações representativas dos pilotos de helicópteros, a tal ponto de um jornal de grande respeitabilidade e circulação em São Paulo, e no Brasil, estampar em manchete :“Helicóptero, o novo brinquedinho de luxo do governo paulista”; as associações representativas dos pilotos civis mobilizavam-se tentando evitar que os integrantes da Corporação pudessem pilotar e cuidar de suas aeronaves, para não perder postos de trabalho para a categoria;
→ Posicionamento pessoal de integrantes da Força Aérea Brasileira, o que não representava o pensamento daquela instituição, que se colocavam contra a possibilidade dos helicópteros da Polícia Militar serem pilotados por seus próprios Oficiais;
→ O espaço reservado à nova Unidade : duas salas sob o alojamento de Praças do 2º BPChq (em que o teto das salas e o piso de assoalho do alojamento eram a mesma coisa) e mais um “porão” com cerca de dois metros de altura, com porta para o pátio da mesma Unidade, que servia como Sala de Operações e permanência dos Tripulantes;
→ Alguns posicionamentos internos na Corporação que não vislumbravam, na nova modalidade de policiamento, mais um eficiente meio de combate as crime, além de outros tipos de missão, o que representava um avanço tecnológico, até com certo atraso. E tanto isso é verdade que, ao verificarmos o crescimento da nova Unidade, constatamos que se transformou no que hoje é de sobejo reconhecido por todos aqueles que, no momento inicial, mostraram-se contrários.
Considerações finais
Apesar das adversidades apontadas, é justo que também se faça referência a pessoas que, nada tendo a ver diretamente com a criação da nova Unidade, empenharam-se sobremaneira para que os objetivos pudessem ser alcançados e, até correndo riscos pessoais inerentes às suas funções à época, deram sua desinteressada contribuição.
Outros houveram, mas os mais significativos foram o então Ajudante Geral da Polícia Militar, o saudoso Cel PM Francisco Antônio Coutinho e Silva, que garantiu a possibilidade de quatro Oficiais fazerem o Curso de Piloto de Helicóptero em escola civil e o Chefe do então Centro de Suprimento e Manutenção de Material Bélico da Polícia Militar, Ten Cel PM Dalmiro Gomes, que forneceu todo o suporte logístico que envolvia desde a aquisição de combustível de aviação até o fardamento especial utilizado pelo pessoal.
Estas duas pessoas mencionadas, juntamente com outras que por questão de tempo não estão sendo citadas, fizeram com que houvesse certo equilíbrio na balança dos “a favor” e “contra” a criação da inédita Unidade da Polícia Militar.
Apesar da data de criação oficial por Decreto do Grupamento de Radiopatrulha Aérea não ser 15 de Agosto, a Corporação, após estudo e levando em consideração que esta data coincidia com o recebimento oficial e permanente de um helicóptero para todas as atividades possíveis de serem desempenhadas por este eficiente meio de policiamento, na história da Polícia Militar esta é a data escolhida como o ponto de partida deste bem sucedido empreendimento.
Este artigo é uma homenagem aos que plantaram em terreno tão árido um novo tipo de vegetal e que dele cuidaram com tanto amor, que as gerações que os sucederam entenderam tão bem seu espírito empreendedor e de servir toda a comunidade: ele cresceu, reproduziu-se e hoje se espalha por boa parte da terra paulista.
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