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Olendino Francisco de Souza

Os heróis existem – O incêndio do Edifício Andraus

EDUARDO ALEXANDRE BENI
Coronel da Polícia Militar de São Paulo – Águia 31
Artigo publicado em 09 de agosto de 2011

Antes de iniciar esse artigo agradeço a oportunidade de ter conhecido a pessoa que possibilitou escrever essa história – Comandante Cláudio Finatti (In memoriam). Foram muitas conversas e longas pesquisas. Finatti mantinha um arquivo pessoal invejável e que possibilitou escrever esse artigo.

Faço uma ressalva quanto ao número de pessoas salvas e sequências dos fatos, pois, apesar de ler muito sobre o assunto, muitos anos se passaram e existem muitas versões. Tentei seguir aquilo que foi publicado na mídia à época dos fatos. Faço aqui um breve resumo.

Passados 49 anos dessa tragédia, vimos que esses pioneiros reescreveram a história do salvamento aéreo no Brasil e no mundo e esses pilotos foram os desbravadores e os grande motivadores do uso de helicópteros nas operações de segurança pública e de defesa civil, que nesta época era apenas um sonho.

Muitos deles eram pilotos civis e outros eram oriundos das Forças Armadas e que trabalhavam na Aviação Civil. Como fato histórico, a Polícia Militar, bem como a Polícia Civil de São Paulo, somente receberiam seus helicópteros 12 anos depois dessa tragédia.

Cláudio Finatti da Anhembi Aviação estava no Campo de Marte na hora do incêndio, pilotando o helicóptero PT-HCB, um Enstron F28-A. Foto: Agência Estado.
Cláudio Finatti da Anhembi Aviação estava no Campo de Marte na hora do incêndio, pilotando o helicóptero PT-HCB, um Enstron F28-A. Foto: Agência Estado.

O mais incrível é que, mesmo nos dias de hoje, muitas pessoas ainda não entendem a importância do helicóptero no resgate, no salvamento e no policiamento.

Estados no Brasil iniciaram seus serviços de Aviação de Segurança Pública na década de 70 e também encontraram muitos entraves políticos, econômicas e jurídicos. Atualmente o Regulamento Brasileiro de Aviação Civil Nº 90 (RBAC 90) regulamentou as operações especiais de Aviação Pública e o serviço é realizado em todo o Brasil.

Antigamente, o helicóptero era visto pelas pessoas como um aparelho sensacional e de muita utilidade, hoje, muito embora, não seja a maioria, vêem o helicóptero como um equipamento barulhento e que incomoda o dia-a-dia das grandes capitais.

Em São Paulo, por exemplo, o helicóptero é um grande problema para a “Aviação Regular” (Serviço Aéreo Público), pois o Aeroporto de Congonhas está localizado entre centenas de arranha-céus repletos de helipontos elevados.

Assim, inicio esse artigo relembrando as pessoas da importância do helicóptero no desenvolvimento da Aviação e, principalmente na Segurança Pública e Defesa Civil e, consequentemente, encontraremos algumas respostas para as perguntas que são feitas nos dias de hoje. “Relembrar é viver”.

Antoine de Saint-Exupery, escritor, ilustrador e piloto da Segunda Guerra Mundial, disse, de forma magistral, que: “O futuro não é um lugar onde estamos indo, mas um lugar que estamos criando. O caminho para ele não é encontrado, mas construído, e o ato de fazê-lo muda tanto o realizador quanto o destino.”

O INCÊNDIO DO EDIFÍCIO ANDRAUS – OS FATOS

Às 16:20h de 24 de fevereiro de 1972 a população paulistana assistiu estarrecida ao incêndio que destruiu o edifício Andraus, resultando em uma tragédia sem precedentes.

O edifício Andraus, de 30 andares, na Av. São João em chamas. Foto: Agência Estado.
O edifício Andraus, de 30 andares, na Av. São João em chamas. Foto: Agência Estado.

O edifício, de 30 andares, na Av. São João, era referência para a época, possuía escritórios da Petrobras, Shell, dez companhias de seguros, entre elas a The Tokio and Fire, além das Casas Pirani, uma das mais populares lojas de departamento de São Paulo, que ocupava os quatro primeiros andares do prédio.

Em determinado momento, ocorreu uma súbita escuridão e em poucos minutos mais de mil pessoas se deram conta de um incêndio que tomava todo o edifício. Neste momento começou a corrida pela sobrevivência. A população solidária iniciava uma operação de salvamento, a Polícia Militar utilizava homens e equipamentos para resgatar as vidas em desespero, surgem, então, os heróis, aqueles que lutaram até o último suspiro de força, de coragem, de ternura e desprendimento.

Segundo relatos, o vento nesse dia era forte, 30 km/h, alimentando o fogo, mas esse vento foi a salvação de mais de 700 pessoas, metade no heliponto do edifício e a outra metade na escada interna do edifício, pois, batendo nos fundos do prédio, na direção norte, o vento levava o fogo e a fumaça para a fachada do prédio e para a lateral na Rua Aurora.

Foto que marcou época. Este bombeiro, Cabo Geraldo Alves de Andrade, faleceu algum tempo depois, vítima de queda do caminhão de combate a incêndio na Praça Panamericana. Foto: Agência Estado.

Muitas pessoas, fugindo da morte, com esperança de sobrevivência, buscavam saídas, muitas vezes para a morte, outras para a vida. As chamas devastavam o prédio rapidamente e uma saída foi encontrada, um dos poucos helipontos elevados existentes na Cidade, local que salvou mais de 700 pessoas, com a ajuda de helicópteros.

Com a repercussão dada pelo rádio e pela necessidade, os pilotos, um a um, foram voluntariando-se, buscando seus helicópteros e iniciando os salvamentos. Esse fato foi inédito e, além de nem todos terem experiência nesse tipo de operação, foram obrigados a operar à noite, exigindo esforço e coragem dos pilotos e policiais militares que tripularam as aeronaves.

QUEM ERAM OS PILOTOS

Através de material publicado no Jornal Folha de São Paulo, Caderno 2, de 05 de março de 1972, pelos repórteres: Isabel Dias de Aguiar, Julio Moreno, Luís Carlos Ventura e Renato Russo e por outras diversas publicações e fotos, guardadas carinhosamente pelo Comandante Finatti, foi possível resgatar essa memória esquecida para alguns e marcada na carne para outros.

Dentre eles existiam pilotos experientes, com mais de 3.000 horas de voo em helicópteros e aqueles com pouco mais de 350 horas, como o Comandante Finatti, sem falar dos helicópteros utilizados: Bell 204 e 206, Hughes, Hiller e Enstron. Um feito memorável e que reescreveu a história do salvamento aéreo no Brasil e no mundo.

OS PILOTOS – OS HERÓIS

Alguns desses pilotos ainda voam pelos céus do Brasil e do Mundo. Outros, o destino obrigou-os a alçarem voos mais altos, de onde nos protegem e nos ensinam com suas histórias. Conheçam os pioneiros:

O SALVAMENTO

O pânico era o único sentimento que prevalecia e as pessoas tentavam encontrar forças para sobreviverem. As aeronaves iniciaram uma operação inédita e perigosa, tentavam pousar no heliponto do prédio (encontrava-se interditado), porém a fumaça, o calor, o desespero das vítimas e as antenas impediram, momentaneamente, o salvamento por via aérea, restando somente o lançando de leite às vítimas, que ora bebiam, ora resfriavam o corpo. As pessoas, encurraladas entre a morte certa e a esperança de viver, arrancavam desesperadamente as antenas, tentando facilitar a chegada dos helicópteros.

O Comandante Olendino Francisco de Souza, piloto do Governo do Estado de São Paulo, sabia que enfrentaria três perigos: a fumaça, a laje instável e o pânico das pessoas, entretanto, achou de deveria ser o primeiro a pousar, pois como pilotava o maior helicóptero (Bell 204), se pousasse, os demais poderiam seguir o mesmo caminho. Foi o que aconteceu.

Olendino Francisco de Souza, piloto do Governo do Estado de São Paulo, soube do incêndio por uma estação de rádio. Pilotou o helicóptero PP-ENC, um Bel 204B. Foto: Agência Estado.
Olendino Francisco de Souza, piloto do Governo do Estado de São Paulo, no helicóptero PP-ENC, um Bel 204B. Foto: Agência Estado.

Segundo entrevista dada pelo Comandante Picolli ao JT no dia do incêndio, disse: “o Comandante Sayão foi o segundo a pousar no prédio, o primeiro a ver o incêndio e dar o alarme. Pousou na avenida São João, entre jatos d’água, entulhos, fios de alta tensão e outros obstáculos. Quase morreu em um momento. A fumaça invadiu o motor do helicóptero. Faltou oxigênio e ele teve que “se jogar” sobre a praça da república até conseguir sustentação de novo para o aparelho.

Assim, no helicóptero, PT-EES, um Hiller FH-1100, o Comandante Sayão (Leia o artigo) embarcou o então Ten PM Duxferri Gomes de Oliveira do Corpo de Bombeiros, o 3º Sgt PM Milton Serafim da Silva e o 2º Sgt PM Augusto Cazzaniga, ambos do COE (o Sgt Serafim era piloto privado) e, após várias tentativas de outras aeronaves, conseguiu lançá-los no heliponto, que mediante atitudes enérgicas, conseguiram heroicamente, coordenar o salvamento, controlar o incontrolável e salvar essas pessoas que estavam a beira do colapso.

Na sequência surge outra aeronave, comandada por Zanini e auxiliado pelo Eng. de Bellegard, lançando, em duas viagens, outros três policiais militares sobre o heliponto, o Cap PM Helio Barbosa Caldas, o 3º Sgt PM Wisnton Oscar Boldi da Silva, ambos do Corpo de Bombeiros e o 3º Sgt PM Djalma Evangelista, do COE. Diante deste quadro tétrico surgem os pilotos, heróis anônimos, que ultrapassando todos os limites operacionais e exigindo o que não se pode exigir de uma aeronave, retiraram todas as vítimas do heliponto.

Vale lembrar que o COE era ainda uma Companhia de Operações Especiais e pertencia ao 1º BPM “Tobias de Aguiar”. Essa subunidade teve participação decisiva na operação de salvamento ao lado do Corpo de Bombeiros. Conta o então 2º Sgt PM Newton Ferreira da Silva do COE, que estava no teto do edifício Palladium (fica ao lado do edifício Andraus), e após retirar 8 pessoas com uma corda amarrada entre os prédios, atravessou o vão entre eles por uma escada. A extremidade da escada, apoiada no edifício Andraus, era segurada pelo Ten Duxferri e Sgt Cassaniga. Feita a travessia auxiliou a retirada de 26 pessoas, sendo 13 pela escada “magirus” e 13 pelas escadas do prédio até o térreo.

Cláudio Finatti da Anhembi Aviação estava no Campo de Marte na hora do incêndio, pilotando o helicóptero PT-HCB, um Enstron F28-A. Foto: Agência Estado.
Cláudio Finatti da Anhembi Aviação estava no Campo de Marte na hora do incêndio, pilotando o helicóptero PT-HCB, um Enstron F28-A. Foto: Agência Estado.

Alguns pilotos conduziram suas máquinas sem ao menos possuírem rádios. O ar rarefeito reduzia a potência dos motores dos helicópteros, o que exigia enorme esforço dos pilotos para controlar os aparelhos. O teto baixo, a névoa úmida misturada à fumaça, tudo contribuiu para tornar a missão demasiadamente perigosa.

Os pilotos abasteciam as aeronaves no Aeroporto Campo de Marte e retornavam ao local do incêndio, alguns tinham que manter somente 50% de combustível, a fim de terem mais disponibilidade de potência e consequentemente, poderem embarcar mais pessoas. As vítimas embarcadas nas aeronaves eram conduzidas ao Campo de Marte, Praça Princesa Isabel (centro) e de lá levadas de ambulância aos hospitais, bem como ao Hospital Geral do Exército no Cambuci e ao Hospital das Clínicas.

O heliponto era para 2.400 quilos, mas, como numa sinfonia, utilizaram áreas restritas para os pousos, aproximações arriscadas, mas estavam predestinados a salvarem aquelas pessoas, pois para elas era a única saída, e, cinco horas depois, o heliponto estava completamente vazio, a missão estava cumprida.

Às 22 horas, os helicópteros retiram mais de 700 pessoas das cerca de 1.200 pessoas que estavam no Edifício em chamas. Foram realizados mais de 150 pousos no heliponto interditado do Edifício Andraus e faleceram 16 pessoas.

AS CONDIÇÕES ADVERSAS PARA O VOO

Segundo artigo publicado na Revista Pirelli, Ano XXIII, N 118, de dezembro de 1978, pg 24, 10 anos no Ar, escrita pelo Engo Carlo de Bellegarde de Saint Lary e corroborada pelo Comandante Zanini, relatou, de forma primorosa, o seguinte:

Carlos Henrique de Campos Zanini, piloto da Pirelli, e o Eng. Carlo de Bellegarde de Saint Lary, a bardo da aeronave, resgataram 53 pessoas do Edifício Andraus em 19 viagens com o helicóptero PP-HBN, um Bell Jet Ranger 206A. Foto: Agência Estado.
Carlos Henrique de Campos Zanini, piloto da Pirelli, e o Eng. Carlo de Bellegarde de Saint Lary, a bardo da aeronave, resgataram 53 pessoas do Edifício Andraus em 19 viagens com o helicóptero PP-HBN, um Bell Jet Ranger 206A. Foto: Agência Estado.

“Para dar a dimensão do risco ao qual estiveram expostas as equipagens e máquinas é suficiente considerar os seguintes fatores técnicos, todos conflitantes com as regras normais de segurança de voo, e que foram, por nós, experimentadas e vividas durante a operação:

  • As aterrissagens com visibilidade “zero” quando os helicópteros atravessavam a densa fumaça para colocar-se sobre o terraço;
  • Antenas de televisão invisíveis da fumaça e que se encontravam na trajetória da descida;
  • Turbulência provocada pelas chamas inferiores, com conseqüente dificuldade do controle das aeronaves;
  • Temperatura elevadíssima quando da decolagem, provocando superaquecimento da turbina, que alcançou temperaturas ao redor de 900oC, quando o máximo permitido é de 843oC, durante seis segundo no máximo (helicóptero da Pirelli, PT-HBN, um Bell Jet Ranger 206A);
  • Perda de potência no motor e insuficiente rotação do rotor, devido à temperatura e ao ar rarefeito e, em conseqüência, o helicóptero, logo após a decolagem, não voava, mas caía fora do edifício, em direção à Praça da República, onde, por felicidade nossa, era possível recuperar-se contra o vento e com ar fresco;
  • Quase todos os helicópteros, devido às proibitivas condições de voo, sofreram anomalias de funcionamento de um ou mais componentes. Por exemplo, o helicóptero da Pirelli (PP-HBN, um Bell Jet Ranger 206A) voou durante muito tempo com panes intermitentes de uma das bombas de combustível;
  • Durante as aterrissagens noturnas sobre o Andraus, a fumaça e a garoa que se formavam ao redor do edifício refletiam a luz dos holofotes de aterrissagem, tornando nula a visibilidade externa.”

Esse relato, dado pelos pilotos e publicada pela revista, está repleto de informações técnicas e de valor inestimável. É, inquestionavelmente, um marco histórico para o salvamento aéreo, pois algo muito semelhante aconteceu no incêndio da favela de Heliópolis no dia 17 de junho de 1996 (Heliópolis – O voo a beira dos limites), 24 anos depois. Nesse episódio, lembram os pilotos, do aquecimento acima do normal da turbina e das perdas momentâneas de sustentação da aeronave.

AS HOMENAGENS

Em função desse feito heroico, todos os pilotos, policiais militares, bombeiros, etc que participaram dos salvamentos foram exaustivamente homenageados e não era para menos. Assim, foram oferecidas algumas homenagens a esses heróis, embora não se limitem somente a essas:

  • Troféu “Merecimento Rotariano”, outorgado pelo Rotary Club de São Paulo em 08 de março de 1972, a 18 heróis que participaram no salvamento do Edifício Andraus;
  • Láurea máxima oferecida pela Flight Safety Fundation, com sede em Washington aos pilotos, entre os dias 16 e 18 de outubro de 1972;
  • Prêmio oferecido pela Helicopter Association of America em Las Vegas, EUA, em 1973;
  • Medalha de Mérito Santos Dumont, entregue em 20 de Julho de 1972, em solenidade na Base Área de São Paulo, em Cumbica;
  • Homenagem na Semana da Asa em Santos, 19 de outubro de 1981: o Comandante Cláudio Finatti recebeu um cartão de prata pelo feito no Edifício Andraus e Joelma;
  • Medalha Anchieta e Diploma de Gratidão da Cidade de São Paulo entregue em 26 de outubro de 1972, pela Câmara municipal de São Paulo, etc.
  • Medalha de Bravura da Cidade de São Paulo entregue no dia 30 de Janeiro de 1973 no Museu de Arte de São Paulo, Assis Chateaubriand, com a presença do Governador de Estado Laudo Natel e do Prefeito Figueiredo Ferraz;

Em 2002, o Grupamento de Radiopatrulha Aérea (GRPAe) da Polícia Militar de São Paulo homenageou os heróis que participaram do incêndio do Edifício Andraus.

Nesse evento estavam presentes pilotos e bombeiros que também atuaram no incêndio do Edifício Joelma, com a participação ilustre do primeiro piloto de helicóptero do Brasil, Comandante Carlos Alberto (Conheça sua história). Na época ele era piloto da Pirelli e, na companhia do Eng. Carlo de Bellegarde de Saint Lary, participaram do trágico incêndio do Joelma.

UM DETALHE CURIOSO

O Comandante Portugal Motta, que pilotava um Bell 206 e que salvou 100 pessoas no incêndio, quando era Oficial da FAB, havia interditado o heliponto em meados de 1969, pois haviam instalado nele muitas antenas de televisão e outros aparelhos e retiravam a segurança do heliponto.

A administração do prédio não se interessou em reabrir o heliponto e então ficou válida a sua interdição. O detalhe que esse era, segundo informações da época, o único heliponto registrado de São Paulo e aquele que interditou foi um dos heróis que participou do salvamento.

AS DISCUSSÕES PROMOVIDAS APÓS A TRAGÉDIA

Na época do incêndio muitos questionamentos surgiram sobre o então Código de Obras de São Paulo, principalmente sobre a segurança desses edifícios e, assim, o Jornal Folha de São Paulo, Caderno 1, de 05 de março de 1972, levantou vários problemas, fazendo um paralelo com o Código de Obras de Nova York. A seguir, alguns pontos discutidos na época:

  • Melhor dimensionamento dos sistemas de escoamento dos edifícios, “halls”, áreas comuns, escadarias, etc;
  • Estanqueidade, continuidade e incombustibilidade das caixas de escada, proposta seguramente mais significativa que qualquer exigência de escadaria externa;
  • Inclusão de portas corta-fogo, em determinados casos e posições estratégicas, proposição que assume grande importância, sobretudo para escolas, teatros, cinemas e locais de reunião pública em geral;
  • Sistemas de indicações precisas sobre a possibilidade de aberturas em paredes divisórias, para atingir áreas de saída e edificações vizinhas; sinalização adequada, nos grandes edifícios, sobre os meios de escoamento de emergências disponíveis;
  • Criação de dispositivo permanente de fiscalização e vistoria, capaz de assegurar o razoável cumprimento das disposições básicas de segurança, e
  • Construção de helipontos elevados em Edifícios, a fim de possibilitar o pouso de helicópteros;

Vimos nessas questões discutidas na época muitas realidades de hoje, uma delas é a enorme quantidade de helipontos elevados nos edifícios paulistas.

Evidente que sua utilização hoje se deve pela disseminação do uso do helicóptero no transporte de pessoas, principalmente de autoridades e executivos, entretanto, podemos afirmar que a inclusão de helipontos nos projetos de construção dos prédios na cidade de São Paulo foi decorrente dessa tragédia, mas, mais especificamente, por conta do incêndio do Edifício Joelma em 1974 (será tema de outro artigo), pois ele não possuía heliponto e, por isso, muitas pessoas morreram no teto do prédio, mostrando na carne a importância do heliponto.

A PREVISÃO

Não querendo ser injusto com pessoas que lutaram pela utilização e disseminação do helicóptero no Brasil, farei uma menção honrosa ao Comandante Judimar Piccoli, que foi o idealizador da Escola de Pilotagem Anhembi e um dos pilotos que mais defendeu o uso do helicóptero no Brasil e foi um ícone na Aviação, além de excelente piloto:

Em matéria publicada no Jornal O Estado de São Paulo, de 11 de janeiro de 1973, o Comandante Piccoli disse, quase de forma premonitória, o seguinte:

“O incêndio do Andraus serviu para dar o impulso inicial, embora algumas poucas pessoas já soubessem como podem ser eficientes os serviços prestados pelo helicóptero. Mas parece que tudo foi esquecido. O Órgão responsável pelo trânsito da Capital, a Polícia, os grandes hospitais – todos podiam estar utilizando o helicóptero como uma das formas mais eficientes de colher informações de toda a cidade em poucos minutos e também de prestar assistência à população. No Brasil, não se aprendeu ainda a aproveitar a modalidade e a rapidez desse aparelho. Quem sabe num outro incêndio…(grifo nosso)

Antes de continuar a leitura, peço um minuto de silêncio…Quando estudamos os fatos e relembramos a história nos damos conta de fatos estarrecedores como esse.

Assim, temos que fazer, nesse momento, uma alusão ao incêndio do Edifício Joelma, ocorrido no dia 1° de Fevereiro de 1974, dois anos depois do incêndio do Andraus e um ano depois do que disse o Comandante Piccoli. Pode parecer pura coincidência, mas quem conhecia o Comandante e sua vasta experiência, sabia que isso realmente poderia acontecer. O resultado desta tragédia foi cerca de 345 feridos e mais de 180 mortos.

OS RESULTADOS

Considerando ainda o incêndio do Edifício Joelma, ocorrido em 1 de fevereiro de 1974, dois anos depois do incêndio do Andraus, vimos hoje, que essas duas tragédias foram as precursoras de várias providências que surgiram nas décadas seguintes.

Um dos pontos mais importantes de toda essa discussão iniciada, por conta dessas duas tragédias, foi a necessidade do Estado aparelhar suas Polícias e Corpos de Bombeiros com helicópteros e a necessidade constante de modernizar seus equipamentos e técnicas de salvamento.

A proliferação dos helipontos elevados em São Paulo, inclusive em hospitais e o aumento da segurança nos projetos dos novos edifícios foi, certamente, resultado dessas tragédias. As pessoas hoje se esquecem disso, reclamando do barulho dos helicópteros, problemas para os aeroportos, como ocorre em São Paulo, o excesso de exigências nos projetos de combate a incêndio, etc. Isso é falta de memória. Por isso, vamos relembrar.

Importante frisar que nessa época o Hospital das Clínicas de São Paulo não possuía heliponto elevado, hoje possui dois e com toda infra-estrutura para o desembarque de enfermos. O Grupamento Aéreo da Policia Militar de São Paulo é o seu maior usuário.

No campo legislativo, outro resultado importante dessas tragédias (Andraus e Joelma), foi o avanço gradativo da conscientização, por parte do poder público, na elaboração de decretos e leis estaduais que criaram uma legislação coerente sobre Segurança contra Incêndios.

No caso de São Paulo, o município criou o Decreto nº 10.878 de 07 de fevereiro de 1974, que foi o primeiro regulamento oficial sobre segurança contra incêndio de edificações no Brasil. Detalhe, este decreto foi sancionado uma semana após o incêndio no edifício Joelma.

Desde então, os decretos sofreram várias atualizações que culminaram com o atual Regulamento Estadual de Segurança contra Incêndios, aprovado por meio do Decreto Estadual 46.076 de 31 de agosto de 2001. Este é o terceiro regulamento oficial de segurança contra incêndio em edificações, elaborado pelo Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo, aprovado 29 anos depois do incêndio do Edifico Andraus.

Muitas coisas ainda ficarão sem respostas, mas uma coisa é certa, o helicóptero se consolidou como um instrumento eficiente e eficaz, não só no transporte de pessoas, mas no salvamento, na observação do trânsito, no resgate, no trabalho da imprensa, no policiamento, etc.

Importante, agora, que o Poder Público, da mesma forma como ocorreu com regras sobre segurança contra incêndio em edificações, aprove regulamento sobre a Aviação de Segurança Pública e Defesa Civil. Quantas tragédias precisarão acontecer para que essa atividade seja devidamente reconhecida pelos legisladores.

Hoje, Comandante Piccoli, seu sonho e desejo é uma realidade.

REFERÊNCIAS

  • Jornal Folha de São Paulo, Caderno 2, pg. 14, de 05 de março de 1972, pelos repórteres: Isabel Dias de Aguiar, Julio Moreno, Luís Carlos Ventura e Renato Russo, “A história completa do incêndio Andraus.”;
  • Revista Pirelli, Ano XXIII, N 118, de dezembro de 1978, pg 24, 10 anos no Ar;
  • O Estado de São Paulo, de 12 de outubro de 1972, Jornal da Tarde, pg. 21, “Um prêmio para onze pilotos, heróis do edifício Andraus.”;
  • Folha de São Paulo, 1o Caderno, pg. 12, de 05 de março de 1972 – “Como evitar que isto se repita.”;
  • O Estado de São Paulo, pg. 14, de 26 de fevereiro de 1972, “Doze helicópteros, 7 fatos e uma façanha.”;
  • Folha de São Paulo, 2o Caderno, pg.15, de 05 de março de 1972, “O que os outros fazem contra o fogo.”;
  • O Estado de São Paulo, de 11 de janeiro de 1973, Jornal da Tarde, pg. 3, “Os heróis não vão a Las Vegas receber seu prêmio.”;
  • Revista O Cruzeiro, de 3 março de 1972, no 10, pg.22, “O Inferno”;
  • Fotos da Agência Estado, dos Jornais e do acervo pessoal do Comandante Finatti;
  • Entrevista com o Cap Ref PM Newton Ferreira da Silva.

Autor: Eduardo Alexandre Beni é Coronel da reserva Polícia Militar de São Paulo trabalhou 22 anos no Grupamento de Radiopatrulha Aérea. É piloto comercial de helicóptero, instrutor de voo e editor do site Resgate Aeromédico.

Nota: As pessoas que possuírem mais informações, fotos, ou que sugiram alterações, correções no texto, favor enviar mensagem no e-mail: [email protected].

Olendino Francisco de Souza, o piloto que salvou mais de 300 pessoas no incêndio do Edifício Andraus

EDUARDO ALEXANDRE BENI
Coronel da Polícia Militar de São Paulo – Águia 31
Editor do Resgate Aeromédico

O dia 24 de fevereiro foi escolhido como o “Dia do Piloto de Helicóptero“. A razão dessa escolha foi para reverenciar o heroísmo dos pilotos de helicóptero no fatídico incêndio do edifício Andraus ocorrido no dia 24 de fevereiro de 1972, na cidade de São Paulo.

Nesse artigo vou contar um pouco da história do Comandante Olendino Francisco de Souza (in memoriam), que pousou o helicóptero Bell 204B, 32 vezes no Edifício Andraus, resgatando 307 pessoas. O comandante concedeu muitas entrevistas ao longo de sua vida relembrando os fatos que vivenciou.

Comandante Olendino Francisco de Souza ao lado do Hiller FH-1100. Foto: Acervo pessoal.

Não tive o privilégio de conversar com o Comandante Souza. Ele nos deixou em janeiro de 2008, na cidade de Bauru aos 79 anos, decorrente de um Acidente Vascular Cerebral (AVC). Conheci o Comandante Souza através das histórias do Comandante Claudio Finatti, que também tinha vasto material guardado e que me permitiu escrever o artigo “Os heróis existem – O incêndio do Edifício Andraus“.

Segundo o próprio Comandante Souza em entrevistas, ele não gostava de ficar lembrando das cenas que presenciou. Da mesma forma aconteceu com o Comandante Finatti, que em todas as nossas conversas sobre o assunto falava com muita tristeza, respeito e gentileza nas palavras.

Antes de começar a história, sabemos que muitas pessoas participaram do salvamento, mas falaremos com mais atenção dos aviadores. Faço uma ressalva quanto aos números e sequências dos fatos, pois, apesar de ler muito sobre o assunto, muitos anos se passaram e existem muitas versões.

Tentei reproduzir as longas conversas que tive com muitos protagonistas e seguir aquilo que foi publicado na mídia à época dos fatos. Faço aqui um breve relato.

Mas afinal, quem era o Comandante Souza? 

Através de matérias publicadas em A Gazeta, Jornal da Cidade, O Estado de São Paulo, Diário de Bauru, Diário Popular, Diário de São Paulo, Diário Oficial de São Paulo, e por outras diversas publicações e fotos do acervo pessoal de Souza, guardado carinhosamente pelo Comandante e por sua família, foi possível resgatar essa história.

O Comandante Souza nasceu em Patrocínio (MG) e aos 15 anos saiu de casa. Passou por dificuldades em sua infância mas o trabalho em uma oficina mecânica em Ribeirão Preto mudaria sua trajetória. A habilidade manual era tanta que logo começou a consertar carros. Por isso, foi convidado para trabalhar com aviões, pois eram poucos os profissionais especializados na área.

Licença de piloto do Comandante Olendino Francisco de Souza. Foto: Acervo pessoal.

No começo de sua carreira trabalhou em Bauru (SP), onde começou a aprender o ofício de mecânico de aviões. Não demorou muito e já estava voando planadores. Trabalhou como mecânico em Jacarezinho (PR). Em 1958 iniciou seu curso de piloto de helicóptero, mas sua licença de piloto de Nº 9 viria somente em 1960, autorizando para voar o Bell 47-D e o Hiller.

Em 1963 mudou-se para o Rio de Janeiro onde voou em um Táxi Aéreo. Em 1964 foi para São Paulo, a convite do Governador Adhemar de Barros, voar para o Governo do Estado, onde trabalhou por décadas.

Nesse período transportou alguns governadores de São Paulo, entre eles Adhemar de Barros, Laudo Natel, Abreu Sodré, Paulo Egídio, Paulo Maluf e Franco Montoro. Ele voava o helicóptero Bell 204B, apelidado de “Gafanhoto“. Além dele, havia o Comandante Geraldo Magela Wermelinger e o mecânico Antônio Simão Elias.

Souza aposentou-se em meados da década de 90 e passou todo esse tempo com sua família em Bauru, interior de São Paulo.

O dia do resgate

No dia do incêndio, Souza estava no hangar da VASP, em Congonhas. O fogo começou por volta das 16h15 e o helicóptero Bell 204B, matrícula PP-ENC, foi o primeiro a chegar no local. Como a aeronave possuía espaço interno raro para a época ela foi capaz de resgatar um número maior de vítimas no dia 24 de fevereiro de 1972. Pousou 32 vezes no Edifício Andraus, resgatando 307 pessoas.

Segundo relatos do próprio Comandante Souza, nas seis primeiras viagens transportou as vítimas para o Aeroporto Campo de Marte, mas para ganhar tempo decidiu pousar na praça Princesa Isabel, no que também foi acompanhado por outros pilotos. O mecânico de helicóptero Domingos Alzino, que era funcionário da VASP, foi seu copiloto durante os resgates.

Depois que os helicópteros deixavam as vítimas no Aeroporto Campo de Marte e na Praça Princesa Isabel, policiais militares organizavam o desembarque e ambulâncias levavam os feridos para diversos hospitais, entre eles o Pronto Socorro da Barra Funda, Hospital Geral do Exército no Cambuci, Santa Casa de Misericórdia, Hospital das Clínicas, Hospital Emilio Ribas e Hospital da Aeronáutica no Campo de Marte.

A Santa Casa estava preparada para receber até 350 feridos, atendeu cerca de 200 pessoas, a maioria com ferimentos leves e principio de intoxicação. Apenas em seis casos houve a internação. No Hospital das Clínicas, 95 pessoas foram atendidas, a maioria com queimaduras leves e principio de intoxicação, permanecendo em tratamento 12 pacientes. No Hospital da Aeronáutica no Campo de Marte, aproximadamente 200 pessoas foram atendidas.

Olendino Francisco de Souza, piloto do Governo do Estado de São Paulo no helicóptero PP-ENC, um Bel 204B. Foto: Agência Estado.

Durante quase seis horas os helicópteros permaneceram no local resgatando vítimas. A Praça Princesa Isabel foi convertida pela Polícia Militar em uma área de pouso e posto de atendimento. Por volta das 22h30 quando não havia mais pessoas no heliponto do Andraus, o Comandante Souza retornou para o Aeroporto de Congonhas.

Depois de um curto período de descanso, no dia seguinte ao incêndio (25/02), o Comandante Souza, acompanhado de Alzino e do mecânico Antônio Simão Elias, também funcionário da VASP e que voou em um dos helicópteros no dia do incêndio, foram chamados pelo então Governador de São Paulo, Laudo Natel, para receber os cumprimentos pelo serviço realizado.

No Palácio dos Bandeirantes também estavam presentes o Chefe da Casa Militar, Coronel Raul Humaitá e o piloto Alberto Fernandes Delfim, Chefe da Seção de Aeronaves Executivas do Estado. Durante a conversa, o comandante relatou ao governador como as coisas aconteceram. “Alguém teria de pousar em primeiro lugar, e achei que isso competia a mim, que estava com o maior aparelho. Se eu conseguisse, estaria aberto o sinal para os outros”, relatou Souza.

Para ele havia três riscos: a falta de visibilidade, a possibilidade da laje ceder, e uma eventual invasão do helicóptero pelas vítimas em pânico. “A certa altura achei que não deveria esperar mais e decidi pousar, mas antes de tocar o piso tive que arremeter, porque todos queriam entrar no helicóptero ao mesmo tempo. Mesmo assim trouxemos 5 pessoas que o coronel Gilson conseguiu puxar para dentro do aparelho”, complementou.

O Coronel Av Gilson Macedo Rosenburg, coordenador SAR (Serviço de Busca e Salvamento) designado pela então 4ª Zona Aérea da FAB, acompanhou o piloto durante a operação, ajudou-o a coordenar a ação dos demais helicópteros.

Depois do primeiro salvamento, o helicóptero Hiller FH-1100 (PT-EES), pilotado pelo Comandante Sayão (Leia o artigo) desembarcou no heliponto do edifício o então Ten PM Duxferri Gomes de Oliveira do Corpo de Bombeiros, o 3º Sgt PM Milton Serafim da Silva e o 2º Sgt PM Augusto Cazzaniga, ambos do Comando de Operações Especiais (COE) da PM.

Em seguida, outra aeronave comandada por Zanini e auxiliado pelo Eng. de Bellegard, desembarca sobre o heliponto, o Cap PM Helio Barbosa Caldas e o 3º Sgt PM Wisnton Oscar Boldi da Silva, ambos do Corpo de Bombeiros e o 3º Sgt PM Djalma Evangelista, do COE.

Assim, eles conseguiram coordenar o salvamento e permitir o embarque seguro das vítimas nos helicópteros. Segundo levantamento da época, no edifício havia 1.300 pessoas, 700 foram resgatadas e 16 pessoas morreram (12 homens e 4 mulheres).

Não houve relato de nenhum incidente ou acidente envolvendo as aeronaves.

Exaustão

Depois que tudo acabou, o Comandante Souza pousou o helicóptero no Aeroporto de Congonhas, cortou o motor, deitou no chão e entregou-se à exaustão. “Estava uma noite gostosa e eu estava cansado daquela confusão, de ver aquela barbaridade. Eu deitei no chão, na pista mesmo, e acordei horais depois com médico e enfermeiras ao meu lado no ambulatório do Aeroporto.

Segundo relatos da época, Souza estava “desidratado e com acúmulo nervoso”. A vida de depois desse dia não seria a mesma.

Como todos que participaram do salvamento, Souza sempre foi reconhecido como um herói e recebeu prêmios e condecorações ao longo de sua vida. Segundo ele, nunca foi procurado pelas pessoas que salvou, mas sabemos que todas elas, como nós, reconhecem  o trabalho heroico dele e de todos aqueles que trabalharam naquele dia de fogo, fumaça e pânico.

Daí para frente é a história que conhecemos desses heróis.

Para ajudá-los nas pesquisas, indico a leitura de alguns artigos que contaram um pouco da história desses heróis e que certamente foram os responsáveis por tudo isso.

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