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Sergio marques

O incêndio no Clube Elite “XXVIII de Setembro” esquecido na história

SÉRGIO MARQUES
Tenente Coronel PMESP e Historiador

Muito antes das tragédias decorrentes dos incêndios nos edifícios “Andraus” (1972) e “Joelma” (1974), da Vila Socó, Cubatão-SP (1984) ou da “Boate Kiss”, Porto Alegre- RS (2013), a cidade de São Paulo fora abalada por outro sinistro.

Foi o maior do Brasil (na época) em número de mortos e feridos, porém, esquecido pela História.

13 de junho de 1953, sábado, Dia de Santo Antônio. As tradições das Festas Juninas sempre fizeram parte da cultura popular brasileira. Ainda outras duas comemorações fechariam o mês festivo, Dia de São João, 24 de junho e São Pedro, 29 de junho.

Mais uma festa seria realizada no Clube Elite “XXVIII de Setembro”. O nome, com referência a data, lembrava o dia da assinatura do “Ventre Livre”, no ano de 1871, uma das Leis que, gradativamente, durante o século XIX, aboliu a escravidão do Brasil.

O salão de festas do “XXVIII de Setembro” localizava-se na Rua Florêncio de Abreu, 259. 1º andar, no centro velho de São Paulo. A tradicional via hoje tem forte comércio especializado em ferramentaria.

Sua sede ficava em um velho casarão, com dois pavimentos: o térreo e 1º andar. A área térrea, com 2 portões de ferro, típicos de comércio, com 80 metros de profundidade, chegando a antiga Rua Anhangabaú (não mais existente). O espaço era ocupado pela Empresa S. A. Tecido Votex, que o utilizava para depósito de tecidos.

A cidade, em clima de celebração, com luzes, bandeirinhas coloridas, quermesses, missas, fogueiras e “quentão”. O salão do Clube XVIII acompanhava aquela empolgação.
Tal salão ocupava o 1º andar do velho prédio, com 40 metros. Seu acesso, a partir da Florêncio de Abreu, era feito por uma única e estreita escada de madeira, isolada totalmente da área terrena do casarão. A entrada também tinha a função de saída, não existindo nenhuma “saída de emergência”. O assoalho do salão, não sendo de laje, era de madeira, material muito inflamável.

O incêndio no Clube Elite “XXVIII de Setembro” esquecido na história. Foto da época.

O local era frequentado por pessoas muito simples, que labutavam durante a semana e aproveitavam o final de semana para entretenimento, dançando gafieira e samba.

Quanto à lotação do Salão, o Presidente da Câmara Municipal da cidade, vereador Cantídio Sampaio, que foi tenente-coronel da Força Pública, assim se expressou: “afirmou ser de apenas 80 pessoas a capacidade do salão, mas que foi expedido alvará de licença para um baile de 130 pessoas, baile a que compareceram, entretanto, mais de três centenas de pessoas, demonstração clara de que não houve a fiscalização necessária.”

Alguns jornais de época (Correio da Manhã, RJ, de 16 de junho de 1953, p. 6 e 10; A Noite, RJ, mesma data, e Manchete, de 20 de junho de 1953, p. 7) disseram que a lotação do salão ultrapassou 500 pessoas.

“Não é permitida a entrada de menores de 18 anos, nem mesmo acompanhado”…, era a informação na entrada do Clube, que não era cumprida. A entrada para as damas custava 10,00 (cruzeiros antigos), metade dos cavalheiros, que pagavam 20,00 (cruzeiros antigos).

Mas, como a tragédia começou? Com relato no Jornal A Noite, de 16 de junho de 1953, sobre o depoimento do Sr. Benjamin Jorge na Delegacia, após o desastre, que na ocasião era responsável pelo bar instalado no interior do Salão. Na declaração, afirmou que, entre 21h30 e 22h00, foi alertado por um frequentador sobre a existência de fumaça no fundo do salão que, a priori, vinha do térreo. Acionou, então, o guarda-civil de serviço na região, que informou ao Corpo de Bombeiros.

Por não existir o serviço de “190”, que somente seria instalado em 1968, as viaturas saíram da Estação Central dos Bombeiros, na Praça Clóvis Beviláqua, na Capital, em comboios de 4 a 5 viaturas. Não possuindo rádio (exceção ao serviço de Radiopatrulha), caso houvesse necessidade de apoio seria difícil a mobilização.

Após o acionamento, pouco tempo depois, partiram da Estação Central as viaturas do Corpo de Bombeiros da Força Pública. Chegaram ao local do possível sinistro às 00h25, domingo, 14 de junho. O séquito era formado por 04 viaturas, uma delas com a Escada Magirus (incorporada na traseira do veículo, utilizada para a realização de salvamentos em altura ou elevação do bombeiro com mangueira).

A equipe era composta por cerca de 50 bombeiros, comandada pelo tenente Clóvis de Melo. Nos fundos do depósito de tecido, no pavimento térreo da antiga construção, houve o princípio do incêndio. A construção era formada de material altamente inflamável. Parte da guarnição combateu o fogo nos fundos da edificação.

Enquanto isso, no salão do Clube XXVIII de Setembro os pares dançavam alegremente. A orquestra executava as músicas de época. A dança de quadrilha já fora efetuada.

Entretanto, por precaução, o tenente Clóvis e demais bombeiros abriram a porta de aço da loja do depósito de tecidos, no andar térreo da construção, na Rua Florêncio de Abreu. Uma enorme quantidade de fumaça surgiu, dominando a rua, penetrando nas 4 janelas da frente do Clube, que atingiram o salão.

Concomitantemente, alguém gritou do salão: “Fogo! Fogo!”. O suficiente para se estabelecer a confusão, que sorveria inúmeras vidas. O instinto de conservação se tornou uma cilada. Aquela única entrada, na escada de madeira, tornou-se a única saída. Sendo muito estreita, lateralmente só duas pessoas poderiam descê-las para acesso à Rua Florêncio de Abreu.

O incêndio no Clube Elite “XXVIII de Setembro” esquecido na história. Foto da época.

No meio da escada ainda havia um balcão de venda de ingressos. A maioria dos frequentadores teve o mesmo pensamento. Saída por aquela estreita porta, acessando a escada. Centena de pessoas, tomadas pelo temor da calamidade anunciada, atiravam-se de qualquer maneira em direção à escada.

Com a força dos corpos, o balcão de venda de ingressos foi destruído. Diversos indivíduos caíram, sendo pisoteadas pelos demais. Muitos morreram ou se feriram, prensados contra os corrimãos, degraus ou mesmo uns contra os outros.

Externamente, 3 escadas, além da Magirus, auxiliavam na retirada das pessoas. Muitos, não esperando a ajuda dos bombeiros, lançavam-se pelas 4 janelas do velho sobrado, espatifando-se no chão, 6 metros abaixo.

Na escada de madeira, uma massa humana compacta, entalada, e desesperada, que não conseguia se mover. As mortes das vítimas por asfixia e esmagamento começaram a se acumular na escada do terror, geradas por outros desesperados, que procuravam ganhar a porta de saída. Uma luta desenfreada em degrau em degrau.

Os bombeiros de todas as maneiras tentavam desatar aquele gigante nó de gente e aflição. Gritos dolorosos de socorro! Muitos eram resgatados, puxados daquela enxurrada humana.

Um policial civil, Armando dos Santos, o “Camarão”, prestes a se aposentar, também auxiliou no resgate, arrancando alguns da boca da morte. Mas foi agarrado pelo paletó, conseguindo se desvencilhar. Agora, apanhado pela camisa, depois, pelos braços. Resistiu o quando pode, lutando, pois sua vida estava em perigo. Mas, aos poucos, exauridas suas forças, tornou-se mais uma vítima fatal daqueles acontecimentos.

O pavor e o pânico forjaram a tragédia e tragavam mais vidas do que o incêndio…, que agora penetrava no salão. O tropel humano aumentava e estavam cada vez mais embolados. Na ânsia de escapar, mais se misturavam e menos se livravam.

Do lado de fora, bombeiros armaram uma peneira (protetora) de lona, similar a um paraquedas, sobre a qual saltavam as vítimas do terrível sinistro. Outras vítimas pularam no desespero, estatelando-se contra o solo. Fraturas, gritos, cinzas, choro, morte. Bombeiros dependurados nas estruturas do casarão e nas escadas, colocadas à frente das 4 janelas do salão, continuavam incessantemente o trabalho.

Uma jovem, aparentando 20 anos, clama por socorro da janela. Os bombeiros armaram um “paraquedas” e a incentivaram a pular. Vacilante, quando decide saltar, escorrega, caindo sobre a fiação. Presa, de cabeça para baixo, clamava pelo socorro. Infelizmente, o fogo já avançava para a rua. Um a um os fios foram se rompendo, até a queda fatal da moça. Outro, na janela, alucinado, empurrava as pessoas, indistintamente.

O cabo Antônio Duarte do Amaral, do Corpo de Bombeiros, 26 anos, tinha o afã de salvar vidas naquela triste escada de madeira, buscando pessoas naquele emaranhado de vidas. Todavia, as vítimas o puxaram pela farda e o embolaram, ao ponto de ser sugado para aquele trágico turbilhão de pânico e dor.

Enfrentando o perigo, tombou no cumprimento do dever. O cabo Duarte era filho de um sargento veterano, João Duarte do Amaral, também da Força Pública, que falecera anteriormente, em 26 de dezembro de 1952. Um dos soldados do fogo, que participaram do salvamento desse sinistro, foi o então soldado Antônio Fermiano, já conhecido de nossas Histórias (Clique e saiba mais sobre sua história)

Autoridades comparecem ao teatro de horrores. Um deles, o comandante geral da Força Pública, coronel João de Quadros. O Prefeito Jânio Quadros também apareceu, vestindo um sobretudo, por cima do pijama. Auxiliares disseram que o Prefeito anteriormente estava em uma festa. Ao saber do episódio, passou antes em casa e se paramentou para o evento.

Mais uma circunstância, das mais comoventes. Um dos bombeiros, que removia os corpos, teve a atenção para um dos cantos do casarão. Por breve período ficou imóvel, perplexo. Uma das vítimas era o seu próprio filho, morto naquele aquele enxame humano. Em lágrimas, abraçou carinhosamente aquele corpo inerte, beijando-o. Em seguida, voltou ao salvamento. O prefeito Jânio, e demais presentes, que acompanharam aquela triste cena, choraram!

O próprio tenente Clóvis quase foi engolido pela torrente humana, preso pelo uniforme. Mais forte, o sargento José Ramos de Oliveira conseguiu um milagre, tirando-o das garras dos que já viviam um terror e teriam um terrível final.

Chamas, fumaça, cinzas e gritos de desespero cortavam o espaço. O som do fogo, o cheiro da morte, as sirenes. Uma mescla de sentimentos das vítimas, dos socorristas e do público em geral.

Familiares e curiosos chegaram naquele triste ambiente. Muitos tentaram adentrar ao prédio, pois sabiam que seus parentes, pais, avós e filhos estavam na festa. A Guarda- Civil barrou a invasão suicida.

O incêndio no Clube Elite “XXVIII de Setembro” esquecido na história. Foto da época.

Cordões de isolamento foram colocados na Rua Florêncio de Abreu, no Largo São Bento e com a Av. Senador Queiroz, impedimento que a multidão se aproximasse do sinistro. A área era permitida apenas para os profissionais envolvidos (policiais, militares, médicos, enfermeiros, autoridades e jornalistas).

A madrugada tornou-se mais fria e sinistra. Os gritos angustiantes por socorro permaneceram.

O fogo, encontrando material de fácil combustão, progredia, caminhando rapidamente.
A Polícia Central, que ficava no Pátio do Colégio, local de despacho das ocorrências, direcionou as 11 ambulâncias disponíveis para os socorros aos feridos. Mas a tragédia era gigantesca, com necessidade de mais ambulâncias.

Foram requisitadas 03 do Exército, 02 da Base Aérea (Força Aérea Brasileira -FAB), 02 do HM- Hospital Militar da Força Pública, 02 do HC- Hospital das Clínicas, 04 do Hospital Municipal, 02 do Pronto Socorro da Lapa, 04 do SAMDU- Serviço de Assistência Médica Domiciliar de Urgência, perfazendo 30 ambulâncias.

Pelo trabalho dos bombeiros, auxiliado por outros soldados da Força Pública, Força Aérea Brasileira (FAB), Exército, policiais civis e cidadãos comuns, as vítimas eram salvas pelas janelas do salão, único caminho livre e possível, com o salvamento realizado pelas escadas.
Todavia, nem todos esperavam. Mais pessoas se atiraram e se espatifaram no chão.

O fogo fez um muro cair no fundo do prédio. Também parte do teto do salão veio abaixo. O pânico foi agravado pelo avanço do incêndio. Já eram mais de 01h30 da madrugada.

O soldado Waldemar Figueiredo, do Corpo de Bombeiros, e o esfumaçado cabo Sebastião Antônio Fortes, da Força Aérea Brasileira (FAB), enfrentando o fogo, que já dominava o salão de festas, conseguiram conduzir mais de 8 pessoas para a rua.

O soldado Waldemar, 13 meses de Corpo de Bombeiros, 1,50m de altura e menos de 20 anos, foi um gigante. Em uma das descidas da “Escada Magirus” perdeu seu capacete, pois a mulher, que acabara de salvar das chamas, gesticulando em desespero, derrubou seu capacete. A ação, que o desequilibrou, quase levou- os ao chão. O cabo da FAB Sebastião acabou por se ferir durante o socorro.

Os mais calmos, que permaneceram no salão, foram salvos. Escaparam pelas 4 escadas, colocadas nas janelas. Uma corda também foi usada na escada, como medida extrema. Fixavam-na em uma das vítimas e puxavam, salvando alguns ou retirando alguns mortos daquele emaranhado de pessoas desesperadas.

Paralelamente, os corpos também foram retirados. Somente da escada de madeira foram recolhidos 30 mortos e dezenas de feridos. Na calçada, em frente ao salão, uma cena dantesca: eram 46 corpos estendidos, enfileirados, com as roupas em frangalhos, peles dilaceradas, corpos fraturados, com faces que exprimiam o horror sofrido.

Caminhões foram requisitados para o transporte dos falecidos no sinistro. À 03h00 já do dia 14 de junho de 1953 bombeiros e guardas-civis removeram os corpos, que estavam na calçada. Colocados nos caminhões, eram direcionados ao necrotério do Cemitério do Araçá.

Passando pelos cordões de isolamento, os caminhões, ao alcançarem o Largo São Bento, foram assaltados por centenas de pessoas, que desejavam ver os cadáveres. Evitando acidentes, os motoristas reduziram a velocidade. Parentes, amigos e familiares, as centenas, foram ao necrotério. Ali, uma histeria, ao reconhecerem os corpos de seus amados.

Os feridos foram transportados ao HC – Hospital das Clínicas nas diversas ambulâncias disponibilizadas. Durante o dia, o difícil trabalho de identificação dos mortos. A devolução dos corpos aos familiares e despedida cristã de cada ente perdido, quando possível.

Uma delas, como dito, foi o investigador da Polícia Civil Armando dos Santos, o “Camarão”. Mesmo de folga, dirigiu-se ao local da catástrofe com o intuito de auxiliar no salvamento. Ali perdeu a sua vida. Velado na biblioteca do DOPS, às 16h00 do dia 14 de junho de 1953 seu corpo foi transladado para o Cemitério da Lapa.

Acompanhado por muitas pessoas, coma presença de autoridades, inclusive, do Secretário de Segurança, Elpídio Reale, o corpo de Armando foi enterrado. “Post mortem”, foi promovido o bravo servidor.

O cabo Antônio Duarte do Amaral foi velado na sede do Corpo de Bombeiros, na Praça Clóvis Beviláqua, no dia 15 de junho, com gigantesca presença popular.

Mais de 200 carros dos Bombeiros, Força Pública, Guarda-Civil e Polícia Civil acompanharam o cortejo fúnebre, que se seguiu ao Cemitério do Brás, hoje, denominado Quarta Parada. Seu corpo foi transportado por viatura do Corpo de Bombeiros tendo.

A “guarda de honra” foi formada por soldados que integravam a sua própria guarnição. Presentes, várias autoridades, dentre elas, o secretário de segurança, o comandante geral, coronel João de Quadros.

Com 10 anos de serviços prestados à sociedade, foi enterrado com as honras militares de estilo. Deixou esposa, Sra. Regina Amália Porto do Amaral, e duas crianças, Juçara Maria Duarte do Amaral, com 1 ano, e Luiz Antônio Duarte do Amaral, com apenas 10 dias.

Pelos heroicos atos praticados, morto no cumprimento do dever, não sem antes salvar uma dezena de pessoas, foi promovido “post-mortem” à graduação de 3º sargento da Força Pública.

Duas vias homenageiam sua História:

  1. Em São Paulo, Capital: Praça Antônio Duarte do Amaral, no Jardim Paulistano, e
  2. Em Guarulhos-SP: Praça Sargento Antônio Duarte do Amaral, no Parque Marabá.
    O incêndio foi uma tragédia sem precedentes na História policial do Brasil, pois foi o sinistro mais fatal do Brasil de então. Foram 56 mortos, sendo mais de dois terços mulheres. Enfim, pessoas humildes e insubstituíveis para os seus amados.

Infelizmente, somente após grandes tragédias são tomadas providências preventivas. O prefeito Jânio Quadros, recém-empossado no cargo, determinou a intensificação na fiscalização de estabelecimentos congêneres (cinemas, casas de espetáculos etc.), e, em especial, àquelas sem “saída de emergência”, evitando, assim, novas catástrofes do tipo.

Em reportagem especial da Revista Manchete, de 20 de junho de 1953, p. 9, o periódico compatibilizou 58 mortes e mais de 70 feridos naquela trágica noite de Santo Antônio, que se estendeu até a madrugada de 14 de junho de 1953.

O incêndio no Clube “XXVIII de Setembro” ostentou o triste recorde de mortos em edificações por 21 anos. A letalidade só foi superada em 1974, com o flagelo do Edifício Joelma, também na cidade de São Paulo, com 187 mortos e 300 feridos.

Nossas homenagens a todos os atores, vítimas ou socorristas, da maior tragédia brasileira oriunda de incêndio em edificação, fato que há 68 anos enlutou um país inteiro e posteriormente foi esquecido pela História!

BIBLIOGRAFIA:

  • A Noite, RJ, 15 de junho de 1953, ps. 3, 6, 8 e 26; e 16 de junho de 1953, capa e p. 8;
  • Correio da Manhã, RJ, 16 de junho de 1953, ps. 6 e 10; e 07 de julho de 1953, p. 34;
  • Correio Paulistano, SP, 16 de junho de 1953, p. 13; 17 de junho de 1953, capa; e 29 de setembro de 1953, p. 7;
  • D´ADDIO, Nilton Divino. Era para ser um dia de festa. Revista FUNABOM. São Paulo, p. 49-50, 6 de setembro de 2016;
  • DE ARRUDA, Luiz Eduardo Pesce. Polícia Militar: uma crônica. A Força Policial, São Paulo, n. 13, p. 31-84, jan./fev./mar. 1997;
  • Diário da Noite, RJ, 15 de junho de 1953, p.4; 18 de junho de 1953, capa; e 27 de maio de 1959, p. 10;
  • O Estado de São Paulo, SP, 14 de junho de 1953, p. 2;
  • Folha da Manhã, SP, 16 de junho de 1953, capa e p. 2;
  • Folha da Noite, SP, 15 de junho de 1953, p. 4; e 16 de junho de 1953, p. 4;
  • Manchete, RJ, 20 de junho de 1953, ps. 6-11;
  • O Cruzeiro, RJ, 27 de junho de 1953, ps. 6 e 88; e
  • Revista da Semana, RJ, 04 de julho de 1953, ps. 29-34.

O aprendizado da Gripe Espanhola de 1918 e sua aplicabilidade no momento atual

SÉRGIO MARQUES
Tenente Coronel PMESP e Historiador

Na primavera de 1918, precisamente no dia 10 de outubro, o jornal “O Combate” destacava, em matéria de capa, os primeiros casos de Gripe Espanhola no território paulista.

A “Influenza Espanhola”, outro nome pelo qual ficou conhecida a moléstia, desde o início de 1918 devastava as tropas litigantes, indistintamente, na I Guerra Mundial. Dos campos de batalhas se espalhou pelas cidades europeias, asiáticas e africanas, adoecendo as populações civis. Morreriam entre 50 a 100 milhões de pessoas no Mundo durante a pandemia (1918 – 1920).

A “moléstia suspeita” nos bairros Paulistanos era chamada de “urucubaca, gripe, influenza, dengue, puxa-puxa…” e possuía sintomas idênticos a algumas moléstias da época, todavia, absurdamente mais grave. O “gripado” sangrava pelos olhos, nariz e ouvido. Adquiria uma cor azulada. Seus pulmões ficavam cheios de secreção. Pela manhã, doentes… À tarde, mortos!

Um agravante importante: ainda não existia o antibiótico, que combateria as infecções oportunistas. A desnutrição também era um fator preponderante no adoecimento da população.

Os moradores dos bairros mais populares e industriais da época, na chamada zona “além Rio Tamanduateí”, que englobava o Brás, Mooca, Belenzinho, Pari, Bexiga, Bom Retiro, além dos distritos suburbanos (Santana, Penha, Lapa, Pinheiros), foram as áreas mais atingidas. Além disso, a falta de higiene e o acúmulo de pessoas no mesmo aposento favoreciam a propagação da doença.

Era hábito das famílias, principalmente, de origem italiana, nos bairros mais populares, em época de calor, transformarem as calçadas em salas de visita, proseando até tarde da noite, sentados em cadeiras, nas portas ou nas guias da calçada.

Como medida protetiva e preventiva, jornais apelavam para que os guarda-cívicos orientassem as pessoas do perigoso costume no período pandêmico.

No dia 17 de outubro, estas foram as primeiras providências tomadas pelos governantes, a fim de evitar a disseminação do vírus:

  1. Governo do Estado: fechamento de todos os “grupos primários” e Escolas Superiores; fechamentos de externatos; proibição de visitas em internatos, Sociedades Esportivas, Literárias e Recreativas; proibição de reuniões, partidas e jogos (Ex.: o Campeonato Paulista de Futebol foi suspenso); e
  2. Prefeitura de São Paulo: fechamento dos jardins públicos e similares (ex.: Parque da Luz, Museu do Ipiranga, Parque da Aclimação, Butantã); proibição de concertos musicais e do acompanhamento de enterros a pé; fechamento de Igrejas, comércio/indústria, teatro/cinema, bares/botecos/restaurantes; proibição de visitar cemitérios.

Em resumo, a proibição se estendia a qualquer aglomeração de pessoas. Com o aumento exponencial da doença e para atender a população adoecida foram criados 40Hospitais Provisórios”, auxiliados pelo apoio da sociedade civil. Alguns locais ainda fazem parte do cotidiano Paulistano:

  • Hospital Santa Casa de Misericórdia (Rua Santa Isabel): 1000 leitos;
  • Imigração (hoje, Museu da Imigração- Rua Parnaíba): 1000 leitos,
  • Seminário Diocesano (Av. Tiradentes): 400 leitos,
  • Mackenzie College (Rua Maria Antônia): 400 leitos,
  • Grupo Escolar Santana (Liga Nacionalista), hoje, Escola Estadual Padre Antônio Vieira (Av. Cruzeiro do Sul): 400 leitos,
  • Colégio Santa Inês (Rua Três Rios): 250 leitos,
  • Clube Atlético Paulistano (Rua Colômbia): 120 leitos.
  • Colégio Sion (Av. Higienópolis): 100 leitos,
  • Mosteiro São Bento: 100 leitos,
  • Colégio São Luiz (Rua Bela Cintra): 100 leitos, e
  • Colégio Sagrado Coração (Largo Sagrado Coração): 80 leitos, dentre outros.

Complementando as ações do Serviço Sanitário e da Assistência Policial, a Cruz Vermelha, organizações religiosas católicas, ABE (Associação Brasileira de Escoteiros), ACM (Associação Cristã de Moços), Associação de Pastores Evangélicos e Grande Oriente Paulista montaram os chamados “Postos de Socorro”.

Totalizando 46 Postos, disseminados pelo Centro e bairros da Capital, iniciaram suas atividades em 23 de outubro. Auxiliavam aos desprovidos de recursos com distribuição de alimentos/roupas/remédios, fornecimento de sopa/pão, realizando consulta domiciliar ou mesmo nas Unidades.

Exemplificando, o Posto no antigo Teatro São Paulo, entre as ruas da Glória e Conselheiro Furtado, no bairro da Liberdade, distribuía víveres e fornecia sopa e pão. A título de curiosidade, o belíssimo Teatro foi demolido em 1969 para o crescimento da região.

No final de outubro a guerra contra a Pandemia teve dividido o trabalho. O Dr. Arthur Neiva, Diretor do Serviço Sanitário, cuidou da profilaxia e higiene. Quanto a hospitalização, a cargo do Dr. Arnaldo Vieira de Carvalho, Diretor da Faculdade de Medicina.

Por fim, os serviços de socorros alimentares aos necessitados, gerenciados pelo arcebispo Dom Duarte Leopoldo. Somaram-se outras organizações na luta contra a doença: a Liga Nacionalista, “Palestra Itália”, CAP-Clube Atlético Paulistano, inúmeros Colégios, Exército Brasileiro, dentre outras Instituições, também ingressaram na luta contra a doença.

A Força Pública

No exercício da ação humanitária, com o propósito de socorrer as pessoas para o atendimento apropriado, a Força Pública Paulista, como era de se esperar, foi cooptada para a missão. Sob a batuta do coronel Manuel Soares Neiva, a Força se entrincheirou ao lado dos profissionais de Saúde, linha de frente do combate a Gripe Espanhola.

Todos os recursos humanos e de logística foram mobilizados para combater a doença. O coronel Neiva fora comandante do Corpo de Bombeiros entre 1905 e 1918, antes de assumir o Comando Geral da Força Pública, em 1918.

Com 8.833 componentes da Força, previstos em Lei, descontando-se os claros de 10% (vagas não preenchidas), eram aproximados 7.900 homens para atender ao Estado, lutando contra a gripe.

Fachada do Hospital Militar da Força Pública de São Paulo. Foto: Almanak do Correio da Manha RJ.

Eram Unidades Operacionais (policiamento, infantaria e bombeiros) na Força Pública, na Capital, nesta época:

  1. 1º Corpo de Guarda Cívica, com matriz no Quartel do Carmo, no Parque Dom Pedro II. Era responsável pelo policiamento nos bairros Paulistanos da Consolação, Glória, Cambuci e Liberdade. Hoje é o 1º Corpo é o 6° BPM/I, com sede em Santos-SP, responsável pelo policiamento ostensivo na urbe,
  2. 2º Corpo de Guarda Cívica, com núcleo o Quartel do Carmo, no Parque Dom Pedro II. Era responsável pelo policiamento nos bairros Luz, Brás, Santa Efigênia e Mooca. Hoje correspondente ao 2º Corpo é o 7º BPM/I, responsável pelo policiamento ostensivo em Sorocaba e região,
  3. 1º BI- Batalhão de Infantaria (atual, 1º BPChq/ROTA), cuja sede é no Quartel da Luz, na Av. Tiradentes,
  4. 2º BI- Batalhão de Infantaria, cuja sede era o Quartel de Santo Agostinho, na Rua Jorge Miranda. Hoje, o 2º BPM/M, responsável pelo policiamento ostensivo no bairro da Penha e cercanias, na zona Leste da Capital. As instalações do Santo Agostinho são atualmente ocupadas pelo 2º BPChq- Batalhão Marechal Mascarenhas de Moraes,
  5. Corpo de Bombeiros, cuja sede, desde 1887, localiza-se na Rua Anita Garibaldi, e
  6. Regimento de Cavalaria, com suas recém-inauguradas instalações, com sede na Rua Jorge Miranda.

Antes mesmo das primeiras notícias da doença nos Jornais de São Paulo, lá estavam os soldados-patrulheiros-bombeiros acolhendo a população, desesperada com o número crescente de doentes e suas vítimas fatais.

Os caixões eram transportados em caminhões e trens para atenderam aos inúmeros finados. Os cemitérios da Capital (Araçá, Consolação, Brás/Quarta Parada e Penha) não venciam o número de enterros. Foram iluminados no período noturno para aumentar os sepultamentos. Para os pobres, os serviços de remoção, caixão e enterro tornaram-se gratuitos, à custa do Município.

Os policiais auxiliavam as atividades de Defesa Civil (termo não utilizado no período) com a distribuição de medicamentos e alimentos, além do controle dos famosos “sopões”. Colaboravam também no transporte dos “espanholados” para os Hospitais improvisados de São Paulo.

Com a gravidade da Pandemia, as escalas dos policiais e bombeiros se tornaram cada vez mais longas, muitas vezes sem substituição, pois acabavam dobrando o serviço. Em um curto espaço de tempo as demandas multiplicaram-se. Os profissionais disponíveis cada vez mais rareando e ocupados. Muitos foram os militares contaminados nesse triste período.

O desabastecimento, os saques, o funcionamento irregular dos bondes, a fome e os amontoados de cadáveres começariam a fazer parte de um cenário dantesco.
Diante desse cenário, esses bravos soldados não abandonaram a missão de servir e guardar a população: a Cavalaria atuava próximo dos cemitérios, não permitindo aglomerações de pessoas e os Bombeiros apoiavam os chamados de socorro constantes. Os veículos militares apoiavam os Hospitais.

O consumo de limão e do quinino (substância que combate a malária/base da água tônica), pois se dizia que eram eficazes contra a moléstia. As benzedeiras foram acionadas. Iniciou-se a distribuição gratuita de remédios por Farmácias criadas para esse fim. Tudo era válido!

Contudo, sem equipamentos de proteção individual (máscaras, luvas, óculos) ou desinfetantes/álcool, os policiais/bombeiros entravam em contato direto com as pessoas infectadas e seus fluídos.

Como a Gripe era altamente contagiosa, e não havia vacina, os policiais se tornaram vítimas do dever. Deste modo, ela se espalhou pela Força.

Agravou-se justamente no local de descanso dos combatentes: os alojamentos dos Quarteis. As camas eram muito próximas umas das outras, facilitando a proliferação da Influenza entre os policiais e bombeiros não contaminados. Os casados levavam o desagradável vírus para suas residências, um ciclo sem fim.

Diferentemente dos dias atuais, o único meio de comunicação de massa eram os jornais. Entretanto, grande parte da população era analfabeta.

O grupo de risco, além das pessoas com doenças associadas (diabéticos, cardíacos etc.) eram jovens saudáveis, entre 20 e 40 anos. Lembrando apenas que a expectativa de vida do brasileiro, em 1.920, era em torno de 34 anos; no ano 2.000, 70 anos.

A Espanhola encontrou na Força Pública uma mocidade sadia, que não conseguiu se proteger deste temível vírus.

No dia 08 de outubro o capitão Genésio de Castro e Silva, do CE-Corpo Escola, com uma seção de Alunos, esteve presente no Palácio das Indústrias, na Exposição Industrial Paulistana, expostos a grande público durante a Feira.

Dois dias após (10), inauguração das dependências do RC-Regimento de Cavalaria e entrega da Bandeira Nacional à Unidade, com a presença inclusive o Presidente do Estado (Governador do Estado), Altino Arantes. O novel Quartel possuía vasto alojamento, com 700 camas destinadas às praças, 23 aos oficiais.

No dia 15, às 20h00, em ambiente fechado, palestra sobre o “Serviço Secreto de Informações-Espionagem e Contra-Espionagem”, a cargo do tenente-coronel Pedro Dias de Campos, no Batalhão da Luz (sede do 1º Batalhão). Presentes, Alunos dos Cursos da Força (cadetes, alunos-sargentos, alunos-cabos), oficiais e inúmeros convidados.

Durante aqueles trágicos dias, o Corpo Escola, cerne da APMBB (Academia de Polícia Militar do Barro Branco), teria grande surto gripal. Consequentemente, um Hospital Provisório seria criado em suas instalações.

Aliado a tudo isso, as apresentações concorridíssimas da Banda da Força Pública, realizada para todos os públicos. No dia seguinte 16 de outubro, nas páginas de O Combate, as primeiras vítimas da tropa Paulista seriam alcançadas pela Gripe Espanhola. Paralelamente, os exercícios semanais da infantaria e da cavalaria da Instituição eram suspensos.

No dia 19 de outubro os Jornais anunciavam novos casos da Gripe no efetivo policial.
Domingo, dia 20, os policiais não permitiram a realização de jogos de futebol nas várzeas e nos descampados da Cidade, impedindo a concentração de pessoas, fenômeno de risco para a expansão da doença.

Na mesma linha, evitando-se aglomerações prejudiciais ao estado sanitário de São Paulo, também impediram a montagem de barracas nas praças públicas, servidas por camelôs e atividades de vendedores ambulantes (sorveteiros, “refresqueiros” etc.).

São Paulo enfrentava temperaturas elevadas, que não impediam a progressão da Influenza. No dia 24 de outubro, na sede do 1º Batalhão (Quartel da Luz), 24 militares foram vacinados com preparado do Dr. Vital Brasil, Diretor do Instituto Butantã, segundo normas de processo norte-americano. Segundo O Combate, dizia-se que “só na Força Pública num só dia faleceram 400 praças, devido a uma injeção de experiência do Dr. Vital Brasil”, fato desmentido pelo próprio Periódico.

Os Jornais eram censurados desde a implantação do Estado de Sítio pelo Presidente Venceslau Braz, após declaração formal de guerra contra a Tríplice Aliança (Impérios alemão, austro-húngaro e turco), na I Guerra, em 1917. Os dados sobre a Gripe na Corporação não eram amplamente divulgados. Quando a informação não é clara, os boatos surgem!

Na edição de 25 de outubro de O Combate, informaram sobre a contaminação de 411 policiais, dos quais 09 casos eram graves.

No dia seguinte (26), o mesmo Periódico anunciou que o 1º Batalhão estava com 300 gripados (quase 1/3 de deu efetivo total). Em pior situação, o 2º BI, pois raros eram os policiais que não estavam contaminados.

O “2º” era composto por 899 praças (e 21 oficiais). A matéria não incluía os doentes integrantes dos demais Corpos de Polícia sediados na capital Paulista, o que aumentaria ainda mais o número total de doentes.

As primeiras mortes vitimariam a Instituição. No dia 27 de outubro faleceu, em decorrência da Influenza Espanhola, o anspeçada Francisco Lobello, da Guarda-Cívica da Força Pública. As coisas só pioravam. Somente no dia 30 foram contabilizados 16 óbitos de praças no Hospital Militar. Na mesma edição, O Combate relatou que 1.800 policiais da Força Pública foram “espanholados”.

Devido à gravidade, o Secretário de Justiça e Segurança Pública, Eloy Chaves, visitava com frequência o Hospital Militar e os outros Hospitais Militares Provisórios. Era uma mescla de crise na Saúde e na Segurança.

Na batalha contra a Gripe no interior da Força se destacaram os membros do Corpo de Saúde da Instituição (médicos e enfermeiros), classificados no Hospital Militar. Localizado na Rua Jorge Miranda, ao lado do 1º e 2º Batalhões de Infantaria e o Regimento de Cavalaria, a Saúde da Força era comandada pelo major médico Luiz Gonzaga do Amarante Cruz.

Com reduzido efetivo, 60 membros (08 médicos clínicos gerais, 01 oftalmologista, 02 farmacêuticos e 01 dentista – todos oficiais -, além 25 enfermeiros, 04 práticos em Farmácia e demais funções de militares auxiliares), empenharam-se ao máximo para minimizar os efeitos nefastos da moléstia.

Em decorrência da demanda, foram criados na Força Pública “Hospitais Militares Provisórios”, aproveitando-se do conhecimento do Hospital Militar, considerado “Central”:

  • HM- Hospital Militar, da Força (Rua João Teodoro): 300 leitos. Era a Unidade Central do sistema de saúde policial,
  • Hospital do CE- Corpo Escola (Av. Tiradentes): 250 leitos,
  • Hospital do 2º BI – Batalhão de Infantaria (Rua Jorge Miranda): 800 leitos. A partir de 27 de outubro o Batalhão foi adaptado para “Hospital Provisório” para receber os enfermos, pois a incidência da Influenza em seus quadros fora gigantesca. A mudança foi acompanhada pessoalmente pelo Presidente do Estado e o Secretário de Justiça e Segurança Pública, respectivamente, Altino Arantes e Eloy Chaves,
  • Hospital do Colégio Presidente Prudente (Av. Tiradentes): 275 leitos. Atendimento de praças, oficiais e civis (parentes dos militares da Polícia contaminados). A Força disponibilizou 07 policiais para auxiliar os trabalhos dos médicos, e
  • Enfermaria do 1º BI – Batalhão de Infantaria (Av. Tiradentes). Ambulatório, com camas, dirigido pelo major médico Manuel Gonçalves Theodoro.

No dia 01 de novembro, Dia de Finados, cemitérios vazios. A Força Pública estava operacionalmente debilitada, pois, segundo o Correio Paulistano, 2.000 policiais estavam infectados pela Gripe, somente na Capital, internados nos diversos Hospitais disponibilizados e, em especial, nos da própria Força. No interior a situação não era diferente, porém, a História será contada em outra oportunidade.

Como a Espanhola invadiu os Quarteis da Instituição, atacando a maioria dos policiais, a sensível diminuição do policiamento foi notada nas ruas. Os quadros e Unidades do Exército na cidade de São Paulo, que, temporariamente, poderiam cobrir as necessidades de Segurança, também foram tomados pela gripe.

Criminosos, conhecedores das limitações da área da segurança Pública, aqueles não doentes aproveitaram-se da situação para a prática de delitos, sobretudo, furtos em estabelecimentos, que se encontravam vazios. Nós conhecemos bem as consequências da diminuição ou ausência do seguimento fardado da Segurança nas cidades.

As atividades do Hospital Militar Provisório do 2º BI foram encerradas em 09 de novembro, quando todos os doentes tiveram alta, número que chegou a 700 internados. No mesmo mês (26) terminou o trabalho do Hospital Militar Provisório do Colégio Prudente por motivo similar. Por fim, na mesma semana, o Hospital Militar Provisório do CE- Corpo Escola encerrava suas atividades. O Hospital Militar, por ser permanente, continuou em sua ação laborativa.

A pandemia foi vencida em São Paulo em meados do dia 19 de dezembro de 1918.
Em pouco mais de dois meses a Influenza deixou números impressionantes. Em torno de 117 mil pessoas foram infectadas pela Influenza, 23% da população Paulistana. 5.372 pessoas faleceram na época. No Brasil, 35.000 mortes.

Se no dia 01 de novembro de 1918, Dia de Finados, 2.000 (dois mil) policiais estavam infectados pela moléstia na Capital (último dado levantado na pesquisa), esse número até o final da Crise na Saúde fora muito maior.

Possivelmente, em torno dos 3.000 doentes até o final do mês, comparando-se com o fim das atividades dos Hospitais Militares Provisórios.

Contudo, o número que mais saltou aos olhos foram os policiais mortos: 145 policiais militares, que tombaram na defesa humanitária da sociedade Paulista!

No dia 14 de dezembro uma Missa, na Igreja de São Bento, foi realizada em memória e “Sufrágio das Almas dos Soldados Mortos”.

Por fim, o que podemos refletir nesse momento de crise é que a História é cíclica. Na maioria das vezes os procedimentos adotados em 1918 foram repetidos em 2020, no que confere a contenção da doença. Porém, refletimos a necessidade de proteção não somente dos profissionais de saúde, mas dos policiais, que também atuam na linha de frente, no combate ao novo coronavírus (COVID-19).

O texto também homenageia todos os profissionais que, por exercerem atividades essenciais (jornalistas, coletores de lixo, vendedores, caixas, operadores de telemarketing, coveiros, motoristas, cozinheiros etc.), não aderiram ao isolamento social preventivo por questões laborativas.

Charge publicada no jornal O Imparcial da Bahia-1918.

FONTES

Mensagens do Governador de São Paulo para a Assembleia: 1890 a 1930, São Paulo, 14 jul 1919, p. 1-113.
ASSEMBLEIA LEGISTIVA (SP). Lei N 1.559, de 20 de outubro de 1917. Fixa a Força Pública do Estado de São Paulo para o exercício de 1918. Disponível em: https://www.al.sp.gov.br/…/lei/1917/lei-1559-20.10.1917.html. Acesso em 15 mar. 2020
DE ARRUDA. Luiz Eduardo Pesce. Polícia Militar: uma Crônica. São Paulo. 2014.
IBGE. População estimada de São Paulo (cidade), 2019. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/sp/sao-paulo.html. Acesso em 15 mar. 2020.
_____ População estimada de São Paulo (Estado), 2019. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/sp.html. Acesso em 15 mar. 2020.
Jornal O Combate, São Paulo, 18out18, capa; 19out, capa; 24out18, capa; 25out18, capa e p.3; 26out18, capa; 27out, capa; 29out18, capa; 29out18, capa; 04nov, capa; 09nov18, capa, 11nov18, capa; 12nov, capa; 13nov, capa; 16nov18, capa; 17nov18, capa; 19nov, capa; 20nov, capa; 21nov, capa; 22nov, capa e p.3; 23nov, capa; 25nov, p.3; 27nov18, capa; 27nov, capa; 29nov, capa, 30nov, capa e p.3; 02dez18, capa, e p. 3; 03dez18, capa e p. 3; 04dez18, capa; 05dez18, capa; 06dez18, capa; 07dez18, capa e p. 3; 10dez18, capa e p.3; 11dez19, capa e p.3; 12 dez18, capa; 13 dez18, capa e p.3; 14dez18, capa e p.3; e 16dez18.
_______ Correio Paulistano, São Paulo, 09out18, p.3; 11out18, p. 2; 13out, p.4; 15out, p. 2; 16out, p. 3; 17out18, p. 3; 18out18, p. 3; 19out, p.3; 20out, p. 3; 21out, p. 2-3, 22out, 2-3; 23out, p. 2-2; 24out, p. 2-3, 25out, p. 3-4; 26out, p. 2-3; 27out, p. 2-3; 02nov18, p. 2-3; 04nov18, p. 2; 28nov18, p. 3; e 21set29, p. 10.
_______ A Vida Moderna, São Paulo, 26 nov 1918, p. 19,
SANCHES, Andreia. MENDONÇA, Cátia. GUERREIRO, Joaquim. CORREIA, Dinis. A vida desde 1820. Disponível em: https://acervo.publico.pt/mult…/infografia/a-vida-desde-1820. Acesso em 17mar. 2020.
TASCHNER. Natalia Pasternak. Gripe espanhola: 100 anos da mãe das pandemias. Disponível em: https://saude.abril.com.br/…/gripe-espanhola-100-anos-da-m…/ Acesso em 18 mar. 2020.
TELHADA. Paulo Adriano L. L. Quartel da Luz: Mansão da Rota: Histórias do Batalhão Tobias de Aguiar. São Paulo: Just Editora, 2011.

O Paraquedista “voluntário” e a história do 1º Salto da América do Sul

SÉRGIO MARQUES
Major da Polícia Militar de São Paulo

Domingo, 01 de novembro 1925, véspera de feriado prolongado do “Dia de Finados” (Mortos), há exatos 94 anos, no Campo de Marte, zona norte da capital Paulista, o 2º tenente Antônio Pereira Lima entraria para a História do Paraquedismo Brasileiro e da América do Sul de uma forma surpreendente.

Tenente Antônio Pereira Lima
2º Tenente Antônio Pereira Lima

Negro, em uma sociedade recém-libertada da escravidão, Antônio Pereira Lima nasceu em 1899, na Capital Bandeirante, filho de Dona Idalina Maria da Conceição e do Sr. José Pereira Lima. Com 18 anos, voluntariamente, ingressou como soldado, em 07 de junho de 1917, na Força Pública Paulista (atual Polícia Militar do Estado de São Paulo). Já sargento, durante a Revolução de 1924, a “Esquecida”, naqueles terríveis dias de julho, permaneceu ao lado dos poderes legalmente constituídos.

Todos os inferiores, como eram chamados os Sargentos, inclusive nosso homenageado, que preencheram os requisitos estabelecidos no art. 6º da Lei 1.981, de 17 de outubro de 1924, foram promovidos em 10 de novembro de 1924 a Aspirante-a-Oficial.

Artigo 6.º – Os inferiores que tenham prestado relevantes serviços á legalidade serão matriculados, como aspirantes, no Curso Especial Militar, independentemente de exame vestibular e edade. 

Concomitantemente, foram matriculados e ingressaram no Curso Especial Militar- CEM (atual Academia de Polícia Militar do Barro Branco-APMBB). Na época a Escola de Oficiais funcionava na Rua Ribeiro de Lima, cruzamento com a Av. Tiradentes, no centro da Capital, área atualmente ocupada pelo COPOM/SP.

Por força da Lei 2.051, de 31 de dezembro de 1924, que reorganizou a Força Pública do Estado, foi recriada a Aviação da Força Pública Paulista, sob a denominação “Esquadrilha de Aviação- EA”. Era a terceira fase da aviação militar Paulista. Por sinal, a primeira fase nasceu com a publicação da Lei 1395-A, de 17 de dezembro de 1913, dentre outras proposições, foi criada a Escola de Aviação Militar. Sob os auspícios da Força Pública Paulista nasceu a aviação militar Brasileira.

Artigo 2.º – A esquadrilha de Aviação, creada por esta lei, será commandava por um major e terá o seguinte pessoal: Um 2° tenente secretario-intendente, Um primeiro sargento, Dois segundos sargentos, Um terceiro sargento, Dois cabos, Um cabo carpinteiro e Oito soldados.

Em 1925 a sede da Escola era em prado próprio da Instituição, o Campo de Marte, no bairro de Santana, na zona norte da Capital. A área hoje não mais pertencente à PMESP, sendo um dos aeródromos de maior trânsito de helicópteros do Brasil.

Também há no aeroporto um espaço reservado à sede do Grupamento de Radiopatrulha Aéreo – GRPAe, com os seus famosos helicópteros “Águias”. Como o lendário pássaro grego “Fênix”, renasceu a Aviação Militar Paulista em 1984, após sua extinção, decorrente da derrota militar na Revolução Constitucionalista do distante ano de 1932.

Na Aviação Militar, a “5ª Arma” (ao lado da Infantaria, Cavalaria, Artilharia e Engenharia), vários Aspirantes, todos voluntários, submeteram-se, no ano de 1925, a inúmeros testes com o intuito de serem aprovados no concurso para ingresso na Esquadrilha de Aviação da Força. Dez foram os aprovados, incluso nosso personagem, o Aspirante Pereira Lima.

Com seus demais camaradas, frequentava o curso da Escola de Oficiais, no CEM. Os Oficiais-Alunos Aviadores também acumulavam as aulas teóricas e práticas na Esquadrilha. Cada curso, 6 meses de duração. No inverno daquele ano, mais precisamente, 08 de julho de 1925, alcançaria finalmente o Oficialato, com sua promoção ao posto de 2º tenente.

Mais qual a relação do “salto improvisado” do 2º Tenente Antônio Pereira Lima com a Cruz Azul?

Decorrente da Revolução de 1924, ocorrida na Capital, com a morte de policiais durante a refrega resultaram muitos órfãos e viúvas dos soldados tombados ou mesmo licenciados do serviço ativo, decorrente dos graves ferimentos sofridos.

Uma comissão de Damas da Sociedade Paulistana solicitou o apoio ao coronel Pedro Dias de Campos, Comandante da Força Pública (que assumiu as responsabilidades em pleno desenvolvimento da Revolução, dela participando ao lado dos Legalistas), com o intuito de ampará-los.

Com uma visão privilegiada, o coronel Pedro Dias, filho de indígenas, edificou, em 28 de julho de 1925, uma Instituição de amparo aos familiares dos soldados da Instituição, a “Cruz Azul”, ideário ainda presente em nossos dias. Os objetivos da novel Instituição beneficente eram manter os serviços de assistência permanente às famílias dos militares estaduais, escolas maternais e jardins de infância para os seus filhos.

Com a ação colocada em prática pelo Comandante Geral, os órfãos e viúvas dos combatentes tombados ou seriamente lesionados não mais ficariam desamparados!
Todavia, como é comum em obras dessa natureza, não havia recursos para a edificação de um Hospital e de um Colégio.

O valoroso Comandante se valeu de rifas, quermesses, gincanas, jogos. A década de 20 do século passado o estilo musical predominante era “Fox”. Uma banda do mesmo ritmo foi criada, o “Jazz-Band” da Cruz Azul, que alegrava as festas com o “hit” do momento. Tais apresentações também arrecadavam fundos para que o sonho pudesse se materializar. E a mão-de-obra? As próprias Unidades da Força cediam policiais, que também eram pedreiros, eletricistas, encanadores, etc.

Em uma de suas ações mais audaciosas, sempre com o mesmo notável objetivo, o grande Comandante teve uma ideia avançada para os padrões daqueles dias, a contratação de um paraquedista para apresentação.

O salto do paraquedista foi marcado para o dia 01 de novembro de 1925, um domingo. Em período ainda sob os auspícios da “Belle Époque”, com a sociedade eminentemente machista, o paraquedista contratado para o feito era uma mulher, uma francesa, Janette Caillé.

Aliada a grande divulgação do exótico espetáculo, pois o salto seria o primeiro de São Paulo (e da América do Sul, segundo trabalho do então Capitão Franco Olívio Marcondes), houve grande venda de ingressos para assistir ao incrível feito.

Pouco antes da realização do salto, a Cruz Azul, na Av. Tiradentes, fundava seu primeiro Grupo Maternal, com muitos berços para hospitalizar crianças carentes, iniciando seu programa assistencialista. Na sequência, as autoridades se dirigiram ao Campo de Marte.

O salto foi um sucesso! Assim escreveu, em 02 de novembro de 1925, o Jornal Correio Paulistano, com a grafia de época: “… Merece especial referencia, dos principaes aspectos dessa tarde de aviação, o audacioso salto realizado de um aeroplano, voando em grande altura, pelo tenente Antonio Pereira Lima, que sahiu galhardamente dessa difficil prova, festejado ao ganhar o solo pelos vibrantes applausos dos assistentes.”

Mas não foi uma senhorita francesa, de nome Janette Caillé, contratada para efetuar o salto com paraquedas?

Os relatos abaixo, com as adaptações do autor que escreve essas linhas, foram obtidos no livro clássico, de leitura obrigatória, “Asas e Glórias de São Paulo”, que conta a História da PMESP e da Aviação Militar Paulista.

São seus autores:

  • José Canavó Filho, Coronel PM, hoje eternizado no Obelisco Mausoleu do Ibirapuera; e
  • Edilberto de Oliveira Melo, 97 anos, Coronel PM mais antigo da PMESP, com inúmeros outros livros sobre a quase bicentenária Instituição de Tobias de Aguiar (O Salto da Amazônia; Raízes do Militarismo Paulista; Marcos Históricos da PM, Clarinadas da Tabatinguera, Pro Brasília e O Centenário da Aviação Militar Paulista).

O já então tenente-coronel PM aposentado Antônio Pereira Lima, em meados da década de 70 do século passado, era morador do bairro de Vila Mariana. Quase octogenário, cego, casado com quem intitulava “querida noivinha, querida Norma”, bem-humorado e absolutamente temente a Deus, recebeu, em sua residência, os autores da famosa obra, que colheram relatos dos bastidores do salto, que não foram contemplados na matéria jornalística do Correio Paulistano, de 02 de novembro de 1925.

Dia 01 de Novembro de 1925 – O salto do paraquedista “voluntário”

pereiralima1Com os ingressos vendidos, o Campo de Marte estava lotado e as Autoridades presentes! Pouco antes do horário do espetáculo, a senhorita gaulesa, por indisposição (saúde), mandou cientificar o coronel Pedro Dias de que não poderia saltar.

A boa reputação e credibilidade da Força Pública estavam em xeque. A senhorita francesa colocara o coronel Pedro Dias de Campos em uma “sinuca de bico”. O que fazer?

O Comandante dirigiu-se, então, ao “Ninho das Águias da Força Pública”, no próprio Campo de Marte, na Esquadrilha de Aviação, mesmo local que se daria a proeza do salto.

Colocando os 15 Oficiais-Alunos Aviadores em linha, o coronel Pedro Dias solicitou um “voluntário” para o salto de paraquedas, que, por lógica, não apareceu. No dia anterior, lembrando-se que se tratava de um feriado prolongado do “DIA DE FINADOS” (Dia dos Mortos), pela 1ª vez tiveram contato com um paraquedas, na testagem do equipamento.

Amarraram-no em um saco de areia, que fazia o papel do “homem alado”. Em seguida, jogaram-no, entretanto, o paraquedas não abriu, espatifando-se ao solo.

Mas sempre em situações similares despontam “voluntários à moda militar”. O Comandante Geral Pedro Dias, olhando um, olhando outro, parando em frente ao nosso “agraciado”, apontou a ele, dizendo: “- O Senhor saltará no lugar da faltosa.”. Pronto, estava resolvida a questão! “Santo voluntário…”, pensaram os demais aviadores na linha.

Nosso herói dirigiu-se, então, a sala reservada para vestir o macacão branco e o capacete da francesa Janette, acompanhado pelos seus irmãos de armas. SEMPRE muito solícitos, animavam a cobaia, ou melhor, o paraquedista improvisado: “- Não tenha medo, coragem, Pereira Lima, não é nada, você é forte… etc.”.

Os camaradas sabiam que se não fosse ele, seria um deles! Que fosse o próprio Pereira Lima, pois já estava com os paraquedas em seu corpo. Segundo o coronel Anchieta Torres, um dos grandes pesquisadores da História da Polícia Militar, o 2º tenente Pereira Lima fora escolhido para a missão pelo coronel Pedro Dias devido a sua pequena estatura, pois o macacão branco da paraquedista francesa só serviria nele!

Sentados estão o instrutor Orton Hoover e o Ten. Antônio Pereira Lima. Em pé o Ten. Negrão e Marcondes.
Sentados estão o instrutor Orton Hoover e o Ten. Antônio Pereira Lima. Em pé o Ten. Negrão e Marcondes.

Decolou em uma aeronave Curtiss da Força, um biplace, de fabricação americana, pilotada por Orton Hoover, ás da aviação estadunidense, que lutara na I Guerra Mundial. Era, naquela ocasião, instrutor de voo da Esquadrilha de Aviação da Força Pública.

Ganhando altura, já com a aeronave no céu, somente o piloto, o paraquedista improvisado e Deus… É chegado o momento do clímax. Hoover fez sinal para o salto, e, com típico sotaque, declamou: “- Lims, sarr…ta, Lims sarr…ta”. Responde o corajoso Tenente Pereira Lima: “ – Seu Hoover, é comigo que o senhor está falando?” Hoover, devolve: “- Yes Lims, sarr…ta; my God!”

Nosso herói na asa da aeronave olha para baixo… Não devia tê-lo feito! Grudou-se desesperadamente na barra de ferro que ligava os dois planos da asa, olhando ao piloto, negando com a cabeça, dizendo: ” – daqui não saio, daqui ninguém me tira.”

Após algumas manobras mais radicais de Hoover, inclusive um “looping”, o Tenente Pereira Lima é convencido, “pela lei da gravidade”, lançando-se no “azul do firmamento”, com a abertura do paraquedas.

Entretanto, o tirante (tira de couro) da perna estava mal colocado, pois, além de não estarem familiarizados com a amarração do instrumento, os demais Oficiais-Alunos Aviadores desejavam despachar rapidamente a “encomenda aérea.”

Sofreu terrível dor em sua parte íntima. Mesmo durante aquela tarde, enxergou pequenas estrelas…, ficando “fora do ar” por instantes. Para aliviar a “pressão”, “lá”, abriu as pernas durante o plainar.

Em sua “leve aterrissagem”, perfura a capota de lona de um veículo, de placa branca, estacionado próximo da área de pouso, o que amenizou sua aterrissagem. O público acabara de descobrir que o salto fora realizado por um Oficial da Força Pública.

Independentemente, foi ovacionado por ele. Talvez não tenha percebido a cor do paraquedas pelo pequeno incômodo durante o voo…, mas transformara-se no 1º paraquedista brasileiro.

Ainda atordoado, ouvia “os bravos e os vivas” do público. Seus amigos, após aquele milagroso sucesso, carregaram-no nos ombros até às autoridades. No caminho, inúmeros cumprimentos, saudações, tapinhas nas costas. Nascia uma lenda!

Entretanto, a História ainda não estava encerrara. O epílogo não seria dos melhores. De canto de olho observou que seu Chefe máximo, o Comandante Geral, não estava para muitos amigos. “O corpo fala…, até grita… e como!” Aproximando-se do Comandante Geral, que tinha aqueles olhos negros e amendoados a fitá-lo, o coronel Pedro Dias disse ao nosso heroi: “ – Tenente, você saltou de perna aberta! Deveria saltar na posição de sentido! Você vai pagar o conserto da capota do meu carro, ouviu!” O veículo oficial pertencia ao Coronel Pedro Dias.

No ano seguinte, 31 de agosto, na Campanha de Goiás, em perseguição à Coluna Miguel Costa – Prestes, Pereira Lima, na função de copiloto da aeronave sofreu um acidente terrível na cidade de Uberaba-MG.

Permaneceu por 8 (oito) dias em coma, porém, resistiu aos graves ferimentos. O piloto da aeronave, Tenente Edmundo da Fonseca Chantre, não teve a mesma sorte, falecendo no local, tornando-se o primeiro mártir da Aviação Militar Paulista.

O Tenente Pereira Lima, participou efetivamente nas Revoluções de 1930, quando a Aviação militar foi extinta por Getúlio Vargas e 1932, no 1º BCP (hoje 1º BPChq-ROTA), sempre defendendo sua Força Pública, São Paulo e o Brasil.

Após 32 anos de serviço, aposentou-se em 03 de fevereiro de 1949 no posto de Tenente-Coronel. No Hospital Cruz Azul de São Paulo, no bairro do Cambuci, que auxiliou em sua construção com seu salto improvisado, acolheu seu último suspiro em 07 de outubro de 1978, aos 79 anos.

O tenente Antônio Pereira Lima foi homenageado como patrono da Turma Aspirantes 2018, da APMBB, formandos no último mês de dezembro. Também foi agraciado com o nome de rua, a “Coronel Antônio Pereira Lima”, no bairro de Perus, na zona norte da Capital, logradouro oficializado através do Decreto nº 17.054, de 04 de dezembro de 1980.

Agora, veterano Sr. Antônio Pereira Lima, ao lado do Eterno, pode tranquilamente contemplar o sol, o céu e as estrelas, integralmente!!!

Leia tambémHistória da Aviação da Força Pública Paulista – Parte 3 – Paraquedismo

Fontes:

  • ANDRADE, Euclides, DA CÂMARA, Hely F. 1931. A Força Pública de São Paulo: São Paulo: serviço Gráfico da PMESP, p. 200-203.
  • FILHO, José Canavó, MELO, Edilberto de Oliveira. 1978. Asas e Glórias de São Paulo: São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, p. 53-69;
  • História da Cruz Azul. Disponível em: http://www.cruzazulsp.com.br. Acesso em: 20 out 17;
  • Jornal Correio Paulistano, 1925, São Paulo, 02 nov. 1925, p.3;
  • Jornal Correio Paulistano: Pensamento e Arte (Suplemento), 1956, São Paulo, 05 ago. 1956, p.9;
  • MARCONDES, Franco Olívio. A Aviação e o Paraquedismo. Revista Militia, São Paulo, n. 52, p. 32-34, 1954;
  • MELO, Edilberto de Oliveira. 2010. Clarinadas da Tabatinguera. São Paulo, p. 78-80;
    SÃO PAULO (Estado). 1924. Lei n. 2.051, de 31 de dezembro de 1924. Reorganiza a Pública do Estado. Disponível em: http://www.resgateaeromedico.com.br/…/2051-1924-esquadrilha-a…. Acesso em: 18out 17;
  • Tenente Antônio Pereira Lima. A Força Policial. São Paulo, n. 25, p. 1-2, 2000. Disponível em: http://www3.policiamilitar.sp.gov.br/…/2016/04/Revista25.pdf. Acesso em: 18 out 17; e
  • TORRES, Anchieta. Coisas da Força Pública: Paraquedista. Revista Militia, São Paulo, n. 27, p.19-20, 1952.

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