Denísia Ferreira Oliveira
Capitão PM – COMAVE/MG
O sonho de voar, para a maioria dos aviadores, nasce na infância e é cultivado ao longo da adolescência, até chegar o dia em que se têm as condições necessárias para iniciar uma carreira na aviação.
Todo esse tempo de contemplação da profissão é reforçado por inúmeras leituras, filmes e conversas do dia-a-dia. O candidato a aviador não perde uma oportunidade de tirar os pés do chão e muito cedo percebe que não basta apenas vontade para alcançar seus objetivos: é imprescindível manter uma boa saúde além de longas horas dedicadas ao estudo de manuais, normas e todas as disciplinas que possam vir a contribuir para melhor exercer a profissão escolhida.
Mesmo após realizar o grande sonho de voar o aviador ainda está sujeito a uma série de variáveis que podem influenciar tanto no progresso quanto na manutenção de sua carreira. Para gerenciar essas possíveis ameaças, é necessário continuar os estudos, acompanhar as evoluções tecnológicas que surgem dia-a-dia, realizar treinamentos, manter os cuidados com a saúde e mais uma série de outras atividades que variam conforme a área de atuação.
Preocupados com os conhecimentos técnicos muitos aviadores não percebem sua vulnerabilidade às mais diversas desordens físicas e mentais que podem comprometer sua vida profissional. Na tentativa de não se afastar da atividade aérea, muitos tendem a ignorar os sintomas que aparecem e não raras vezes fazem sua automedicação: ingerem um analgésico, um antialérgico, um remédio pra dormir, um calmante e tentam seguir com sua rotina e seus compromissos diários.
Essa tentativa de “manter uma vida normal apesar dos sintomas” vai de encontro aos princípios da Segurança de voo. Cada remédio ingerido, sem o devido acompanhamento de um profissional, pode representar uma grande ameaça: os efeitos colaterais podem comprometer a consciência situacional e, consequentemente, a tomada de decisões.
Cabe ao aviador, nessa hora, demonstrar seu profissionalismo e entender seus limites. Por mais indesejável que seja o momento de uma restrição para o voo, também é uma época de reflexão e autoconhecimento. É preciso considerar que os aviadores são pessoas habilitadas para operar máquinas e tomar decisões, mas não são super-heróis.
Assim como uma saúde debilitada não contribui para a segurança de voo, a ansiedade não contribui para a recuperação de doenças e nem tampouco para a correta visão de que, não estando em plenas capacidades físicas e mentais, o aviador torna-se uma ameaça, que pode comprometer a segurança das operações.
É fundamental conhecer a si mesmo e isso inclui conhecer os limites do corpo e da mente. A teoria de gerenciamento do erro e da ameaça (TEM), muito discutida na 6ª Geração de CRM, serve como um referencial que alerta quanto a importância do adequado gerenciamento das ameaças que podem contribuir negativamente para a segurança do voo.
Assim sendo, se não temos capacidade plena laboral pra exercer uma determinada atividade, nos tornamos uma ameaça a ela e, se essa ameaça não for devidamente gerenciada (o que também inclui o afastamento do trabalho para o devido tratamento) podemos nos tornar de fato um risco para a atividade aérea.
Sabe-se que não é fácil superar essa fase: assim como num voo, é preciso ter disciplina para manter o tratamento, tomar os remédios adequadamente, fazer os repousos e cumprir todas as prescrições médicas de forma que, quando voltar para a atividade, esteja-se com plenas capacidades para exercer as funções anteriores dando as respostas adequadas, sem comprometer a segurança da operação.
Estar com os pés no chão, não só fisicamente mas também emocionalmente, pode ser mais saudável e com certeza mais seguro do que ignorar quaisquer sinais de alerta do corpo.