Alagoas – Mesmo com as campanhas de conscientização, as ligações falsas para unidades de saúde ou para serviços de urgência e emergência de Alagoas, popularmente conhecidas como trotes, têm causado transtornos entre os profissionais da saúde.
De acordo com o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), dados das Centrais de Regulação de Maceió e de Arapiraca revelam que, de janeiro a outubro deste ano, das 324.266 ligações para o serviço, 109.047 (33,62%) foram trotes.
O mais recente foi registrado na sexta-feira (6), quando um homem ligou para a central de atendimento informando que ele e um amigo tinham caído de uma moto na BR-104, entre os municípios de Branquinha e União dos Palmares, na zona da mata de Alagoas, e que o amigo estaria desacordado devido ao impacto do acidente.
O SAMU então liberou um helicóptero do Serviço Aeromédico e a Unidade de Suporte Básico (USB) de Murici, além de ter acionado a Polícia Rodoviária Federal (PRF), por ser uma rodovia federal. Ao chegarem ao local, as equipes constataram que não havia nenhum acidente e que tudo não passava de um trote.
Segundo Mayara Tavares, enfermeira e coordenadora da Base Descentralizada de Murici, a equipe da USB chegou até o local da ocorrência e constatou de que não havia nenhum acidente e que havia sido um trote.
“Não demoramos 10 minutos para chegar no suposto local do acidente. Não verificamos nenhum sinal que pudesse sugerir que a queda de moto realmente tinha acontecido. Procuramos e não vimos o veículo, não tinha sangue na rodovia e ainda percorremos aproximadamente uns 20 km, até a cidade de União do Palmares, procurando as vítimas e não achamos nada. O sentimento que fica é de revolta e tristeza, porque podemos deixar de atender alguém que realmente precisa do serviço, além de arriscarmos nossas vidas a cada ocorrência”.
Para o médico Marcos Viana do serviço aeromédico, essa brincadeira de mal gosto pode acabar custando a vida de outras pessoas, que estão precisando realmente de um atendimento de urgência e emergência naquele momento.
“Quando fomos acionados para essa ocorrência, saímos o mais rápido possível. Sobrevoamos pela extensão da BR-104, chegando até a cidade de União dos Palmares, e nada da ocorrência. Então, percebemos que deveria ser um trote, uma atitude irresponsável e triste, e por causa dessa brincadeira de mal gosto, acabamos deixando uma grande área sem a cobertura”, salientou.
“Se naquele momento acontecesse um acidente de trânsito grave, um afogamento, uma suspeita de infarto ou de AVC, existia o grande risco dessas pessoas morrem. A população alagoana ficou sem o atendimento dessas duas equipes, porque estávamos preocupados em socorrer as vítimas dessa falsa ocorrência. Queremos sempre salvar todas as pessoas que precisam desse atendimento de urgência e emergência, e a população não pode ser prejudicada por conta dessas pessoas que insistem em fazer esse tipo de brincadeira”, lamentou o médico.
A central de atendimento do SAMU tentou retornar a ligação para a pessoa que solicitou o serviço, mas o telefone estava desligado. De acordo com Luiz Antônio Mansur, médico regulador do SAMU Alagoas, devido ao tipo da ocorrência, foi necessário fazer a liberação rápida das equipes para poder salvar aquelas supostas vítimas.
“Estou há 17 anos no SAMU Alagoas, e essa foi a primeira vez que liberei viaturas para uma ocorrência falsa. Quando conversei com o solicitante, não notei nada de anormal no tom de voz, ou qualquer outro sinal que demonstrasse que aquela ligação fosse um trote. O rapaz relatou que a vítima mais grave estava inconsciente e, por ser um acidente em uma rodovia, liberamos o helicóptero, que é uma UTI aérea, e a ambulância de Murici, para chegarmos mais rápido, avaliarmos o paciente e tentarmos estabilizar a vítima”, destacou Luiz Antônio Mansur.
“É triste saber que as pessoas continuam insistindo em passar trotes para o SAMU, que é um serviço essencial, e que lida diretamente com vidas. Caso alguém não tenha um atendimento rápido, pela falta das viaturas que estão se deslocando para um trote, pode significar a morte desse paciente”, afirmou o médico.